domingo, 14 de novembro de 2010

Simonal: o rei da cocada preta

Temos grandes compositores e músicos na história da música brasileira. Como não admirar a intelectualidade de Chico Buarque, Caetano Veloso, Milton Nascimento; a ousadia de Tom Zé e Tim Maia; a emoção dos sambistas Cartola, Noel Rosa e por aí vai. São muitos nomes. Mas, particularmente, como cantor de fato, admirar voz em si, ficar admirada com presença de palco e com domínio de público, tenho dois grandes ídolos: Ney Matogrosso e Wilson Simonal. O primeiro sempre ouvi falar, mas aos meus 15, 16 anos que fui me encantar, conhecer melhor, ir aos shows e ficar realmente fã. O segundo fui ouvir falar lá pelos 18 e imediatamente fiquei fã. O ápice do encanto se deu vendo os vídeos. Quando envolvida e conhecendo Simonal, fui compartilhar com meus pais minha nova 'descoberta' e imediatamente me falaram da sua conexão com a ditadura. Eu não pudia imaginar que isso tivesse sido tão sério.

Vendo o documentário de Simonal fui entender porque demorei a ouvir falar sobre ele. Famosos cantores da década de 1970 como Chico, Gil, Caetano, a gente nunca deixou de ouvir falar. Já o Simonal, se perdeu na história da música brasileira por uma história mal contada que se tornou uma verdade cruel. O fato é que o cantor achou que estava sendo roubado pelo contador, que negou. De acordo com o funcionário, o cantor tinha perdido um contrato com a Shell e os recursos dos shows eram insuficientes para bancar seu padrão de vida. Sem estar convencido, Simonal levou o funcionário pro DOPS pra que confessasse, a custa de torturas, o roubo. De acordo com o contador, ele resolveu inventar que estava roubando o cantor quando o torturador disse que traria a família dele para também sofrer agressões. O contador denunciou Simonal na delegacia civil e o cantor, quando viu que a coisa era séria, tentando ver uma saída e ter proteção, disse que tinha ligação com o DOPS. Daí todo o repúdio, julgamento e condenação da imprensa, da classe artística, e, consequentemente, dos brasileiros.

Daí em diante a história de Simonal caiu numa verdadeira tragédia, no seu sentido mais filosófico, explico. As infortunas que nos acometem sempre exigem boas deliberações, para que as desgraças as quais estamos destinados não piorem. Isso porque a existência humana, em si mesma, não é uma catástrofe, mas podemos cometer excessos em nossas atitudes ao tentarmos driblar o destino, desafiando os deuses. É justamente esse excesso que caracteriza a tragédia, sendo essa a representação cênica do drama que recai sobre os homens, tal drama representado pelos erros que estamos sempre suscetíveis pelos limites de nossa razão, as desgraças que estamos destinados, que não podemos nos livrar, mas podemos contribuir para que piore.

E acredito que foi isso que aconteceu com o cantor. Talvez ele estivesse destinado a uma desgraça, mas contribuiu para que piorasse. Sua vida não poderia ser uma catástrofe, mas cometeu excessos demais e isso arruinou sua vida. Diante de uma grande infortuna, Simonal agiu muito mal. Isso tirou o nome do cantor da história da música brasileira por muitos anos. Em 1992 voltou a aparecer, mas sempre com o fardo da ligação com a ditadura nas costas. Sua voz não era mais a mesma, assim como seu brilho e sua alegria. Ele vivia para provar que não tinha ligação com DOPS e que nunca havia dedurado ninguém. Como admiradora intensa dessa voz, suíngue e domínio de público de Simonal, assistindo ao documentário, tentei entender aonde ele errou. O que aconteceu para que a desgraça fosse tão grande.

Simonal era um cantor em plena ditadura. Mas isso, realmente, não lhe importava. Negro, de origem pobre, se preocupava muito mais em ostentar suas riquezas e mulheres. Era isso que lhe importava. Um único fio político que poderia ver em sua postura e algumas músicas diziam respeito ao preconceito contra negros. Só. Simonal ignorava completamente o contexto histórico. De primeira, eu diria que não o condenaria por isso. Quantos músicos hoje temos que estão se lixando pra política? Por outro lado, passei a ver que, num momento de radicalismos, de revolução, não dá pra ficar em cima do muro. Não dá pra fechar os olhos. Ou você tem um lado, ou em algum momento difícil será exigido uma postura sua que questiona de que lado está, porque não há uma esfera em que a ditadura pudesse ser ignorada. Simonal ignorou, menosprezou, e num momento difícil usou o DOPS para resolver um problema pessoal. Ora, mas DOPS não é coisa de esfera pessoal. Trata-se de algo que estava arrancando sangue, vidas e choros de mãe. Simonal não pensou. Ou diria Hannah Arendt, banalizou o mal.

Se Wilson menosprezou o DOPS, foi o que não fizeram a imprensa, a classe artística e militante. Se o cara diz que tem ligação com esse departamento, logo o acusam de ser dedo-duro. Foi a verdade criada que Simonal teve que enfrentar até a morte. E que só na década de 1990 foi possível provar que era mentira. Se o cantor não se importava de não ter um lado, de não lutar contra a ditadura, os seus colegas artistas-militantes se importavam. Se por um lado, ele nunca se mostrou contra ditadura, num deslize que ele pode ter se mostrado a favor, foi suficiente para condená-lo. Nesse escorregão do cantor, quem poderia o defender, não o fez. Daí vem um outro fator que contribuiu para tragédia do cantor: o ataque de uma classe formadora de opinião com a força esmagadora de uma imprensa. Que condena, julga e linxa sem haver provas, se aproveitando de um prato cheio.

Por fim, o último e mais óbvio fator: a cegueira que o sucesso e o dinheiro causam. Simonal adorava ostentar, dizia que não existe pobre feliz; bom mesmo é ter dinheiro. Além de pobre, ele era negro. O jeito de impôr seu respeito, além do talento, era com seu poder financeiro. Ele não queria perder isso, porque ele não queria perder o respeito. Ele sabia que era o rei da cocada preta. Mas achou que isso era infinito. Ficou tão cego, a ponto de usar do DOPS para torturar seu contador. Ele não queria saber como ia sua renda, seus contratos, mas de gastar com o que quisesse. Ao ver que as coisas não iam bem, era mais fácil condenar um funcionário do que entender o que estava acontecendo e baixar a bola.

Ao contrário do que meio Brasil fez e ainda faz, eu não condeno Simonal. Eu não o repudio. O cara errou. Pisou na bola feio. Não soube lidar com os erros. Jamais deixarei de ouvir e o elogiar em mesas de bar pelo. É um dos maiores cantores do Brasil, uma das vozes mais bonitas, tem um dos maiores suingues, quem conseguiu, desde então, dominar uma platéia como ele? Os cantores também são humanos e erram. Que fique seu talento e contribuição para história da música brasileira.

domingo, 24 de outubro de 2010

Agentes de ditadura: Punir ou não punir?

Lei criada em 1979 concede a anistia a todos que cometeram crimes políticos. Impunidade ainda é questionada


Marcantônio Dela Corte e Juarez Maia em 1968. Um ano antes foram presos distribuindo panfletos em defesa da Amazônia.

Marcantônio Dela Corte era um jovem cheio de ideais, sonhava e lutava por um país democrático. Em 1963, pouco antes do golpe militar, pertencia ao Partido Comunista do Brasil (PCdoB), militava nos movimentos estudantis e trabalhava na TV Anhanguera. Em 1966, com a queda do PCdoB no estado, Marcantônio foi preso pela primeira vez por 40 dias, quando o Habeas Corpus ainda era possível. “Eu tinha 20 anos, por mais que tivesse estrutura, fiquei numa solitária, sem o mínimo contato com as pessoas. Dormia no cimento frio, praticamente de cueca: uma situação na qual o ser humano perde as referências” relata.

Assim que veio o AI-5, tudo ficou muito mais difícil e esse processo condenou Marcantônio a três anos de prisão. Até lá ele militou na clandestinidade e também na legalidade, por meio dos movimentos estudantis. Em 1967 Marcantônio e seu companheiro, Juarez Maia (hoje professor de Jornalismo na Universidade Federal de Goiás), foram presos em flagrante distribuindo panfletos em defesa da Amazônia, vítima da grilagem de terras praticada pelos norte-americanos. “Tivemos pena de confinamento. Não podíamos sair de Goiânia e éramos monitorados em tudo que fazíamos. No país, éramos somente eu, Juarez e Jânio Quadros os confinados”, conta Marcantônio.

Em 1969 o AI-5 já vigia e Marcantônio foi preso em flagrante com sete companheiros. Fez uma viagem sob condições desumanas até Juiz de Fora, onde ficou encarcerado num presídio de segurança máxima por três anos. Juarez havia se desfiliado do movimento chamado Ação Popular e juntou-se a um grupo de resistência armada ao regime militar, do qual pertencia a atual candidata a presidência Dilma Roussef. Atuou na região de Goiânia, foi condenado em várias instâncias em Juiz de Fora e foi viver clandestinamente no Rio de Janeiro por quase três anos. Depois, doente e debilitado fisicamente, buscou caminho do exílio no Chile.

Anistia


Em 1979 foi promulgada pelo presidente Figueiredo a Lei da Anistia, ou Lei nº 6.683. Ela estabelece que a anistia é concedida a todos que, no período compreendido entre 2 de setembro de 1961 e 15 de agosto de 1979, cometeram crimes políticos ou conexo com estes, crimes eleitorais e aos que tiveram seus direitos políticos suspensos. Aqui compreende-se torturados e torturadores. Isso significa que aqueles que prenderam e torturaram Marcantônio, Juarez e tantos outros, ficaram impunes.



“Houve muitas negociações, participei da luta pela anistia quase diariamente. Ela realmente foi negociada”, afirma Marcantônio. Ele diz ainda que as forças políticas democráticas naquela época não eram tão fortes a ponto de aprovar outros avanços nessa lei, como a punição dos torturadores. “A partir de 1973 quase todo pessoal da luta armada já estava preso. Foi uma votação apertada pela anistia”, diz.

A partir de então, acontecia um franco processo de abertura. Por outro lado, o regime militar vinha, a cada dia, perdendo o prestígio e força. O fracasso do milagre econômico de Médici, por exemplo, veio a agravar as desigualdades e miséria, além de elevar inflações. O clamor social era muito forte por uma redemocratização. Em 1984, o movimento Diretas Já garantiu uma redemocratização, mas a Emenda Parlamentar que permitia a população votar diretamente para presidente foi rejeitada no Congresso.

O professor de Direito da UFG Arnaldo Bastos afirma que esse movimento foi fundamental para mudança de regime de governo, mas não do grupo de dirigentes. Ele acredita que a democracia não demoraria a ser estabelecida devido ao fracasso do regime e que ter cedido à formação do Colégio Eleitoral contribuiu para que a impunidade de torturadores continuasse a constar na lei. “Não tivemos uma revolução democrática. Até hoje não reformamos a instituição violenta do Estado que é a polícia. Nossas polícias não se comportam como de um país democrático”, contesta.

Impunidade


O professor acredita que a Constituição de 1988 é muito boa, mas fez muitas concessões. “O balanço geral que faço da Constituição é positivo, mas tivemos perdas políticas e a impunidade dos torturadores é uma delas”, afirma Arnaldo. Juarez Maia reforça que a lei foi feita pelos movimentos políticos da burguesia atual em negociação com militares, mas tanto ele quanto Marcantônio acreditam que foi uma lei feita dentro das possibilidades da época e não teria como ser diferente.

Os danos foram muitos. Marcantônio perdeu emprego na TV Anhanguera em 1966. Conseguiu trabalho em outra televisão, mas como militava, a TV o demitiu. Quando foi preso em 1969, ele trabalhava num banco e também perdeu o emprego. “Danos morais se estendem de forma muito grande. Fui ter alguma indenização em Brasília em 2002 por dano material, baseado no primeiro emprego que perdi, não nos demais. Nem sei se chega a ser tão importante assim”, conta Marcantônio.

Em abril desse ano, o Superior Tribunal Federal rejeitou revisão da Lei de Anistia proposta pela Ordem dos Advogados do Brasil. A OAB questionava a concessão de anistia a agentes de ditadura. “Qualquer um que tenha que se envolvido em atos de tortura tem que pagar por isso. Se não fizermos isso, nossa polícia vai continuar torturando”, argumenta o professor Arnaldo. Ele acredita que o fato de não haver punição permite que ação continue a ser praticada.

Marcantônio argumenta que a tortura sempre existiu no Brasil e não é punindo, hoje, aqueles que a praticaram durante a ditadura que ela não continue a acontecer. Ele não é favorável que os coloquem na cadeia, primeiramente porque a lei não permite e é essa a decisão do STF. “Será que o momento é de olharmos para trás com rancor, com ódio, revanchismo? É positivo? Não é melhor olharmos para trás de outra forma, reconhecendo erros e não deixarmos que isso aconteça de novo?”, contesta.

Além disso, Marcantônio sustenta que a maioria dos torturadores está morta e que, se fosse para julgá-los, deveria também julgar comandantes militares, os principais responsáveis, presidentes e ministros. Juarez compartilha do posicionamento de Marcantônio. “Eu não gostaria de ver nenhum velhinho na cadeia, pois estaria sendo injusto. Teria que prender também os responsáveis. Mas não concordo que a memória nacional seja apagada”. Arnaldo, por outro lado, questiona. “Se alguém com 90 anos de idade pratica homicídio, ela estaria impune?”.

Daqui pra frente


Por outro lado, Marcantônio reconhece que as torturas continuam com presos comuns. “Olha o que fizeram no Carandiru em plena democracia. Aqui no Parque Oeste Industrial. Humilharam as famílias de forma absurda, mataram três pessoas e não foram punidos. Veja quantos presos foram mortos durante a ditadura e em uma hora, eles mataram 111 presos no Carandiru”, lembra. O que fizeram no Carandiru, para Marcantônio, é reflexo da repressão que acontecia na Ditadura, mas completa. “Temos que criar uma maneira inteligente de impedir isso, não é punindo torturadores, mas através da educação. A mim, só me cabe perdoar”.



Juarez Maia é a favor da criação de uma comissão nacional de memória do período da ditadura. Ela se encarregaria de saber o que aconteceu, quem foram os culpados, quem torturou, quem mandou torturar, porque se torturou, quem foram mandantes, etc. “E também registrar o outro lado: quem participou dos movimentos, da luta armada, como; enfim, passar a história nacional do Brasil a limpo”, afirma.

Já Marcantônio compartilha da proposta da Associação dos Anistiados de criar Tribunal Popular Nacional para julgar crimes praticados durante o período militar. “Não tem força de lei, mas tem força moral. Condena os torturadores de forma ética e moral”, explica. Ele ainda acredita que o mais correto seria colocar essa história do Brasil nos currículos dos ensinos fundamental e médio, para que se transmita a história de forma mais real. “Essa é uma maneira de educar a população”, explica Marcantônio, que já foi professor de História.

segunda-feira, 27 de setembro de 2010

Uma opinião em período eleitoral

Por Marcelo Carneiro*

Ficamos vendo essa mídia comercial, a todo o momento, nos tratando como idiotas e seres não-pensantes e não-participativos.

Na área em que trabalho, a cultural, vivi nesses anos todos de Governo Lula, um amplo debate democrático e de mudanças para melhorar as condições, tais como, a desconcentração de recursos, a diminuição da burocracia, o melhor atendimento da comunidade em relação à cultura, criação de um plano nacional de cultura a longo prazo, criação de um sistema para unificar a cultura de todo o país, dentre várias outras coisas (e isso numa área que nunca foi prioridade em governo algum). Eu vivo isso e vejo melhoras muito acima, mas muito mesmo, em relação a governos anteriores e governos atuais de outros partidos de estados e municípios que não discutem, praticamente nada, com a comunidade interessada. As políticas só vêm de cima para baixo e ponto.

Isso é uma análise prática, do meu dia-a-dia, e vêm essas mensagens simplistas e, muitas vezes, de fontes desconhecidas e duvidosas, que apregoam que a Dilma é "terrorista” e “guerrilheira", e que o Lula é "analfabeto", "bêbado" e outras coisas mais. Dá licença, né? Eu quero um debate com um nível bem maior, onde podemos nos encontrar cada vez mais em reuniões, fóruns, seminários, congressos e audiências públicas, onde as pessoas podem colocar seus pontos de vistas, seus anseios, - e que sejam divergentes -, mas que sejam propositivos para um país melhor.

Não sou partidarizado, mas quero sempre ser politizado, com uma visão política mais ampliada e com intenções de melhorar de fato nossa comunidade. Ficar encontrando só os "podres do governo", como essa mídia comercial faz e ficar martelando o tempo todo, dá licença, de novo, né? Não estou dizendo que este governo não tenha corrupção e que é perfeito ou se quer chega num quarto do caminho para sê-lo, mas me parece que é a mesma coisa, de eu, como ser humano, cometer erros e chegar pessoas e ficar apoquentando o tempo todo que sou isso ou aquilo. E as minhas virtudes onde ficam? E a minha vontade de acertar, não vai ser discutida?

E se for assim, que venham outros “Lulas” e dêem a mesma abertura e os mesmos índices de desenvolvimento e crescimento que estamos tendo.Sejam bem-vindos “bêbados” e “analfabetos” dessa estirpe, temos muito que aprender com vocês!!!

E vamos sim, votar com consciência e com o coração, que sempre tem a melhor resposta!

* Produtor Cultural e diretor da Federação de Teatro de Goiás (FETEG)

sexta-feira, 24 de setembro de 2010

Para mente e alma

Experiências musicais garantem prevenir e aliviar o estresse. Criatividade, sensibilidade e sociabilidade também são elementos que podem se desenvolver por meio dessas atividades

Trânsito, trabalho, família, relações sociais, diversidade de compromissos, corrida para o sucesso. Esses são alguns fatores da vida moderna que levam os indivíduos ao famoso problema do século XXI: o estresse. Viver na contemporaneidade exige adaptação e momentos de reflexão para que o indivíduo saiba enfrentar e se adaptar a determinadas situações. Contudo, cada organismo reage de maneira singular frente a elas, ora adaptando, ora sendo acometido de estresse. É o que afirma a musicoterapeuta e mestre em música pela Universidade Federal de Goiás, Fernand Ortins.

Nesse sentido, todas as pessoas estão sujeitas ao estresse, umas mais outras menos. Fernanda argumenta que esse sentimento, contudo, deve ser visto também sob uma ótica positiva. É ele que faz as pessoas viverem e realizar atividades. O que não deve acontecer é deixar o estresse tornar-se patológico, caso chegue nesse estágio. “O primeiro passo é averiguar o que está deixando a pessoa em estado de estresse e se possível em qual nível: alerta, resistência, quase exaustão ou exaustão. No último pode emergir problemas de saúde, como por exemplo, alguma doença cardíaca”, alerta a musicoterapeuta.

Para evitar cair em qualquer um desses níveis de estresse, há quem busque a música como forma de terapia. Corais, aulas de instrumentos e musicoterapia são algumas opções que acabam trazendo outros benefícios àqueles que evitam ou combatem o estresse.

Indo além


Elene Mota Tipple é regente do Coral Vozes e Cores e do Coral Infanto Juvenil da PUC-Goiás. Há mais de 25 anos a musicista está a frente dos coros e acredita que a música exige tal nível de concentração das pessoas que as forçam esquecer seus problemas. “O corista tem que se envolver de tal forma que ele se sente obrigado a desligar de outras preocupações. Há poesia, letra e melodia para pessoa refletir. Então ela se envolve de tal forma que naquele momento não tem nem condições de pensar em dificuldades”, diz Elene argumentando como a música ajuda a combater estresse.



Bruna Junqueira, 24, participou dos corais da PUC-Goiás (Primeiro Infantil depois Vozes e Cores) por quase 12 anos. Afastou-se da música por dois anos e foi quando se sentiu tomada por um sentimento de irritação constante. “Eu vivia nervosa. Foi quando percebi que era a falta de música na minha vida e minha irmã, buscando me auxiliar, me convidou a participar do grupo em que cantava, os Passarinhos do Cerrado”, testemunha Bruna.

Após dois anos de reencontro com a música, Bruna hoje afirma que, de fato, isso contribui de forma relevante para seu controle emocional e do estresse. “Hoje me sinto mais relaxada, eu vivia tensa! A música é algo que foge da rotina. Estimula a criatividade, exige outras inteligências e habilidades de você”, afirma Bruna. Elene também acredita que a música vai além, trabalhando sentimento, emoção e sensibilidade.

Essa criatividade estimulada pela música também é lembrada na musicoterapia. “O paciente ao vivenciar o tratamento musicoterapêutico terá a música como uma ferramenta auxiliar no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento ao estresse, de forma menos invasiva e, principalmente, mais criativa. A criação significa vida, saúde e realização pessoal”, afirma Ortins.

Alexandre Ariza é musicoterapeuta, mas também paciente. Ele afirma que chega de um jeito na sessão e sai de outro, pois elas mexem profundamente com suas emoções. “Nem sempre saio alegre, mas saio com outra freqüência de pensamento”. Elene também afirma que quando as músicas são mais alegres ou mexem com a emoção de certos coristas, eles saem diferente do encontro.

Socialização


Romanza de Vieira, como Bruna, participou do Coral Vozes e Cores por seis anos, se afastou por três e acabou voltando a participar do coro em março. A corista afirma que tem estresse o tempo todo por motivos variados, mas afirma que fazer parte do coral proporciona sensações de bem estar. Um dos principais motivos é a socialização. “Eu me divirto vendo meus colegas em palco, com os solos, comigo mesma e sei que isso proporciona algo de bom a mim”. Ela afirma, no entanto, que fazer parte do coral é ter compromisso. E mais compromisso significa mais estresse, mas afirma. “Estar aqui, conviver com pessoas que gosto me faz vir aqui”.

Bruna também reforça a capacidade de socialização da música. “Ela me permite conviver com outras pessoas e estar em outros ambientes que me fazem fugir da rotina. Isso me faz muito bem”. Alexandre reitera como a terapia favorece a socialização. “É diferente eu tocar em casa sozinho e tocar em grupo. Esse é o grande diferencial da música, como ferramenta terapêutica mas também desafio, pois aumenta sua tolerância”, argumenta.

Ele também reforça como a música ajuda a entrar em contato com outras pessoas. “Tocando junto, somos obrigados a nos perceber: isso ajuda a modificar a visão. Abre portas para harmonizar um grupo, para as pessoas se relacionarem melhor”, diz Alexandre. Elene Tipple também reitera a importância da música para socialização. “Quando se canta em grupo, há sempre um outro. Para haver harmonia, cantar à vontade, um tem que ouvir o outro e devem sentir respeito um pelo outro”, argumenta a regente.

Conhecendo a musicoterapia



Fernanda Ortins, que também é professora e musicoterapeuta de três diferentes instituições, afirma que a musicoterapia pode ser utilizada na diminuição e/ou prevenção do estresse, bem como no desenvolvimento de estratégias de enfrentamento ao estresse (coping). O procedimento, para quem desenvolve essa terapia, é primeiramente, participar de uma entrevista inicial e relatar sua queixa. Depois o musicoterapeuta coleta seus dados sonoro-musicais que serão registrados em sua ficha musicoterápica. “A partir da história de vida sonoro-musical deste paciente é que os atendimentos musicoterapêuticos serão desenvolvidos”, afirma Fernanda.

As técnicas aplicadas ao tratamento variam conforme o perfil do paciente, sendo quatro experiências musicais musicoterapêuticas: re-criação, composição, improvisação e audição musical. De acordo com Fernanda, na primeira experiência o cliente pode executar, reproduzir, transformar e interpretar qualquer modelo musical existente. No segundo o terapeuta ajuda o cliente a criar canções, letras ou peças instrumentais. No terceiro o paciente pode fazer música a partir do tocar ou do cantar e pode ser individual e até em grupo. Por fim, na quarta experiência o paciente ouve música e responde à experiência de várias formas como silenciosa ou verbal.

Os resultados dessas experiências são variados, desenvolvendo sentimentos, explora aspectos de relações interpessoais, desenvolve criatividade, liberdade de expressão, melhora habilidades interativas e de grupo. “Por meio dessas experiências musicais musicoterapêuticas, a musicoterapia pode proporcionar o relaxamento, a redução do estresse, o controle da dor, a regulação de funções corporais, estimular imagens (fantasias, associações livres, memórias), energizar (por meio da danças, dramatizações, declamações etc.) e tranqüilizar” afirma a musicoterapeuta.

terça-feira, 24 de agosto de 2010

Um novo modo de fazer política

Redes sociais iniciam um processo de democratização de mandatos em que o cidadão também tem voz

Em meados da década de 1980, Alberto do Carmo, 56, era militante e, como muitos de sua geração, lutava pela democracia. “Naquela época se discutia política em sindicatos, sede de partido, e no meu caso, que tinha proximidade com parlamentares que apoiava, nas festas e casas de amigos”. Hoje Alberto do Carmo é professor de Sociologia da PUC e afirma. “Para quem viveu e militou no período de ditadura militar, era quase impossível pensar que quase 30 anos depois fosse tão fácil criticar, sugerir e palpitar tão de perto”, se referindo a uma nova forma de fazer política: a internet e redes sociais.

Alberto ainda lembra que naquela época não era comum ir ao parlamento para debater ideias, discutir política e projetos. Ele acredita que isso nunca foi costume, mas que a internet e as redes sociais ocupam bem esse espaço de debate. Ivan Almeida, 41, é professor universitário e coordenador de suporte técnico e tem como hábito interagir com políticos via twitter. O professor elogia, sugere, discute idéias, mas também critica.

“Atualmente o cidadão não tem muito tempo para se deslocar até a casa do povo. Ferramentas como twitter são importantes para promover essa aproximação”, diz o professor. Ele ainda arrisca sugerir a realização de audiências públicas via redes sociais. “Além de se discutir determinado assunto, a participação de pessoas de diversas regiões da cidade seria possível, garantindo maior legitimidade ao evento”, sugere.



O deputado estadual do PMDB, Thiago Peixoto, acredita que com o maior uso da internet, cidadão e políticos ganham. Mas ele acredita que a sociedade é a maior beneficiada, pois o meio virtual possibilita maior vigilância. “Todos os cidadãos estão cansados de escândalos e baixaria no cenário político, e por isso a transparência das ações dos agentes políticos, gastos públicos, rito das leis, enfim, tudo isso é algo que a sociedade cobra e sempre deve continuar cobrando”. O deputado acredita, porém, que nenhum político vai se comportar melhor por temor à vigilância. “Quem tem mau caráter vai continuar tendo”, diz Peixoto.

Novos usos



Ivan Almeida acredita que o uso das redes sociais contribui para divulgação do mandato dos políticos, e principalmente, para promover um melhor debate sobre suas propostas. “O twitter permite que o político esteja em plenário e ao mesmo tempo pedindo opinião aos seus seguidores sobre assuntos de interesse da população. Lembrando que os seus seguidores nem sempre são pessoas que compartilham do mesmo ideal político, o que contribui para um debate democrático”, defende o professor.

Thiago Peixoto compartilha da mesma opinião de Ivan. “Hoje os cidadãos podem acompanhar tudo nos mínimos detalhes. Podem questionar, dar sugestões e até se mobilizar de maneira mais eficiente.” Pensando assim, por meio de parceria com uma rádio, o parlamentar teve a iniciativa de criar o programa Envolva-se. Por meio da internet e de um programa radiofônico, os cidadãos compartilham e dão publicidade a causas de seu interesse e buscam soluções para determinados problemas.

Outra moda da internet é promover despachos virtuais, que acontecem via e-mail, twitter e até orkut. O cidadão busca o prefeito ou vereadores, faz seu pedido ou reclamação e dali mesmo é encaminhado. Ivan defende esse método afirmando ser uma forma de dar agilidade ao poder público. Thiago Peixoto afirma que na correria nem sempre dá tempo de despachar com assessores e colegas políticos e por isso carrega sempre seu smartphone.

“Os despachos on line, às vezes, ajudam bastante. Mas existem aqueles assuntos que não dá para se resolver pela internet, ai é preciso ser pessoalmente mesmo”, diz o deputado. O vereador do PCdoB, Fábio Tokarski, concorda que não são todos assuntos que devem ser tratados virtualmente. “De alguma forma a internet facilita parte do acesso necessário. Mas meu temor é criar uma ilusão de que isso equacione todos os problemas”, afirma Tokarski.

Limitações

A interação, contudo, ainda não é plena. Para o doutor em Comunicação e Política, professor da UFG e PUC-Goiás, Luis Signates, o caráter democrático da internet está na possibilidade quase ilimitada da fala livre e garante que essa nova forma de interação, por si só, tem caráter democratizante, apesar de que muitos problemas ainda não sejam resolvidos. Ele acredita que, pela profusão e velocidade de circulação das informações, o poder público pode ser controlado pelos cidadãos. Contudo, acredita que muito ainda tem que ser feito para se falar em controle popular dos mandatos pela internet.



“Deve haver, inclusive, uma inserção maior da população, especialmente da mais pobre na internet e nas possibilidades que ela traz”, defende o jornalista. Tokarski, que atua na política há mais de 30 anos, também acredita que a internet esteja ainda num processo de implantação. “Não conseguimos ainda interagir com uma grande parte dos cidadãos. É uma parcela ainda muito pequena que tem acesso”, diz o vereador que não sente o veículo ainda como forte meio de mobilização.

Um dos fatores limitantes, por outro lado, é o fato do político nem sempre responder a todas as mensagens. Ou por interesse, ou por disponibilidade. “Temos vários exemplos de político que só te responde se for elogio, caso contrário descarta”, reclama Ivan que completa. “Pior é que tem político que escala os assessores para responder, ou seja, a resposta exposta ali nem sempre é a dele mesmo”, reclama. Ele ainda reforça que os candidatos não sabem utilizar as ferramentas para debater propostas, mas as utilizam somente para conquistar votos.

Pouca interatividade

Marcus Fidelis tem seu próprio blog. Ele afirma que para haver uma interatividade ideal, tempo e recursos são necessários. “É preciso ter gente que faça isso. Custa caro”, explica o blogueiro. Ele ainda reitera que essa interatividade é falha não só entre cidadão/político, mas entre cidadão/cidadão, a partir de sua experiência com blog. “Os internautas não interagem. E não é só comigo. O Jornal X, do jornalista Eduardo Horácio, é um blog sofisticado, ele é um analista político. Mesmo na fase em que ele esteve mais ativo, eram poucos os comentários.” Ele acredita que um dos principais fatores é que Goiânia é uma cidade relativamente pequena e as pessoas têm medo de sofrerem represálias se forem associadas a um comentário crítico.


Foto: internet

Para Signates o meio virtual ainda não teve o condão de modificar radicalmente o fazer político no Brasil. “Até pela condição ainda altamente elitista da rede, nos últimos dez anos os políticos simplesmente ignoraram ou não souberam utilizar os recursos que ela tornou disponíveis”, justifica o professor. O vereador comunista também reconhece as limitações. “A internet tem um potencial muito forte, mas passa por um processo de aprendizado de parcela da sociedade”. Tokarski acredita que a motivação da internet, hoje ainda é pessoal e não política. “Nessa dimensão, essa percepção está sendo construída. Não se discute política com P maiúscula. Sinto muita superficialidade”, afirma o vereador. “As mudanças só acontecem com ampla participação da população, as redes sociais permitem essa participação, mas ainda não efetivam”.

Signates acredita ser mais prudente olhar para os próximos anos, do que avaliar o impacto da internet até hoje sobre a política. Sem ousar fazer prognóstico, o professor disse esperar mais contato dos políticos com eleitores, propiciando mais debates e discussão da opinião pública política. Espera que a internet propicie formas mais participativas de tomadas de decisão. “E que nos faça mais comunicativos, mais informados, mais participantes. O que significa sermos muito mais cidadãos do que somos hoje”, diz o professor. Por outro lado, também espera que, por meio desse processo, os políticos se tornem mais atentos, fiscalizados e, portanto, mais responsáveis e corretos.

O cidadão também pode ser repórter

As novas mídias têm provado que os cidadãos podem produzir conteúdo de muita qualidade e com viés que as mídias convencionais não produzem. Marcus Fidelis é um típico cidadão que acompanha e fiscaliza o trabalho do poder público até que, em 2005, teve a iniciativa de criar um blog. Ele soube utilizar de forma cuidadosa e dedicada esse caráter democrático da internet para criticar e refletir fatos políticos que a mídia tradicional não aprofundava.


“Eu atuava como produtor cultural e não via a mídia local dedicar, por questões estruturais, um espaço suficiente nem com a profundidade adequada ao setor”. Incomodado com contradições de discursos e realidades não exploradas, Fidelis resolveu, ele mesmo, ir atrás das informações consultando o Ministério Público e pesquisando a própria mídia.

O blogueiro afirma que o acesso aos políticos hoje é outro. Nas eleições de 2008, Marcus, que também é bacharel em Direito, questionou candidato por candidato sobre uma lei que estava em votação, de estudo de impacto de vizinhança. “Alguns responderam, outros não. Isso depende do perfil do político: se tem uma base eleitoral mais crítica, mais politizada, naturalmente vai estar mais disponível. Mas é preciso lembrar que isso toma muito tempo”, lembra Fidelis.

domingo, 18 de julho de 2010

Salve, Mandela!

Eu não sabia que hoje era aniversário do Mandela. E sem saber, bem na virada do aniversário dele, às 0h de ontem coloquei o tão comentado Invictus para assistir. Já vou falando que não sou crítica de cinema, não vou falar da fotografia nem da direção com propriedade. Se estiver esperando isso, pode ir fechando essa guia. Mas, gosto demais de filme. Gosto tanto que não gosto de ler a sinopse de filmes recomendados para eu me envolver mais ainda quando assistir. E eu não li a do Invictus. O que, com certeza, tornou o filme uma surpresa maior ainda. Quando se fala em filme de Mandela, logo pensei que viria toda aquela história dura e triste dos 30 anos na prisão, da violência moral do Apartheid, da trajetória bonita e humilde do Mandela. Nada disso. Em partes, fico com parte da trajetória política e humildade.

Último filme que assisti de Eastwood (esse inclusive ele foi ator, além de diretor) foi Gran Torino. Achei sensacional. Um filme baratíssimo e muito emocionante. O final é totalmente imprevisível e inimaginável. O oposto de Invictus. O final é totalmente previsível. Mas o que diferencia o filme é justamente uma direção que pega um roteiro, na minha opinião, simples e o torna um grande filme e que fale de Mandela muito mais que qualquer filme meio biográfico. Um recorte muito, mas muito pequeno de tudo que Mandela representou e representa e que com certeza fala muito dele, expressa muito quem foi essa figura e como ela mudou a história da África do Sul. E aqui, quero registrar a importância da interpretação de Morgan Freeman. Ele segura qualquer filme, até aquela porcaria de "Antes de Partir" . Mas vou dizer que nesse filme ele conseguiu atingir minha admiração mais profunda. A difícil sutilidade em ser Mandela. E ele conseguiu com toda costumeira competência.

O limite entre mostrar a inteligência de uma ação de um líder político e a ação de um super-herói extraordinária é muito pequeno. E acredito que o filme poderia, facilmente, ter sido piegas e parecer exagerado ao mostrar que investir num time de Rugby poderia mudar a auto-estima e segregação de um povo. Mas tá aí o crédito ao Eastwood ao conduzir o filme de forma que a gente se convença que Mandela não salvou a África do Sul ao voltar suas energias para o time de Rugby. Mas, pessoalmente, me levantei do sofá com o sentimento que é esse tipo de líder político que falta para governar o mundo. Um rebelde com toda paciência, humildade e tranquilidade. Que sabe para onde olhar, como olhar e como fazer.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Web 2.0 way of life

Seis e meia da manhã. Levantar da cama, pegar uma xícara de café e antes ainda de tirar o pijama, apertar a tecla power do computador que estava no modo stand by. Afinal, enquanto o usuário dorme, o computador baixa uns álbuns de músicas ou vídeos. Inclusive os que nem foram para as lojas ainda. Um bom dia aos amigos do twitter e antes mesmo de acessar o jornal digital, por ali mesmo já se informar das principais manchetes na cidade e no país. Claro, se você souber quem seguir. Dar uma olhada como será a temperatura do dia, se poderá ou não correr no parque no fim do dia.

Checar e-mails, dar o parabéns para amiga via Orkut (que, aliás, foi o que lembrou que hoje era aniversário dela), se informar pelo facebook que hoje tem aquele show tão esperado. Ouvir algumas músicas do novo álbum baixado durante a noite, uma rápida avaliação e em algum fórum fazer recomendações. Pronto, sete horas. Agora já pode tirar o pijama, tomar um banho e cuidar da vida. Essa rotina poderia parecer muito estranha para alguém em 2002. Hoje se torna cada vez mais comum. Trocar, escolher, compartilhar, opinar, participar. É essa a nova forma de se usar internet.

Há sete anos nascia o Itunes, uma loja de música digital fácil de usar, barata e rápida. Nos berços ao lado estavam o myspace e o skype. O objetivo do primeiro era reunir músicos. Bandinhas, bandas e bandonas podem ser ouvidas e descobertas através desse site. Um koreano pode ouvir hoje a demo de um grupinho de forró que foi mixada ontem, e quem sabe gostar muito e levar para um festival de bandas independentes em seu país. Já o skype veio aí para diminuir a saudade de quem mora longe ou aumentar namoros on-line. Vídeo e áudio de alta qualidade. E de graça, o que diminuiu as cifras das contas telefônicas de algumas casas.

2004 foi o ano dos blogs. Como toda nova invenção 2.0, ninguém sabia bem ao certo aonde isso ia dar ou o que fazer com aquilo. Alguns usaram como diário, outros para escreverem aquilo que não poderia ser publicado (seja pela linha editorial ou por falta de acesso aos veículos tradicionais). Alguns souberam fazer daquilo a fantástica possibilidade de jornalismo cidadão, que tem sido a grande esperança dos jornalistas que ainda sonham com um jornalismo melhor. Outros abusaram da criatividade e são pagos para fazer aquilo. Katylene e Hoje Vou Assim que o digam.

E daí os podcastings e youtube, que tiraram muita gente do sofá, que ficava ansiosa esperando chegar as nove horas da noite para ver aquele filme ou aquele programa. Um turbilhão de informações e descobertas. Foi o que o compartilhamento de vídeos e áudios proporcionou. Aqui, fica minha experiência pessoal. Hoje, uma das coisas que tenho mais dispensado meu tempo e mais vivido se chama Passarinhos do Cerrado. Um grupo de coco. Coco? Não sabe o que é isso? Eu também não sabia até 2008. Um ritmo nordestino que simplesmente enfeitiçou a mim e mais cinco goianos músicos.

A gente, por um ano, tocou esse ritmo, dançou, cantou, encantou um bando de goianos, viajamos e conseguimos nos tornar um grupo profissional sem nem conhecer Pernambuco (onde o ritmo é mais forte). Conhecemos e aprendemos tudo via youtube e rapidshare (como o próprio nome sugere, é para compartilhar). Depois de um ano pudemos pular carnaval por aquelas terras e re-conhecer todas as influências, que até então, eram virtuais para gente. Provavelmente se não existisse o youtube e o rapidshare no dia 20 de abril desse ano (nossa festa de aniversário), não reuniríamos 900 pessoas no Circo Laheto para dançar coco.

Esse exemplo, apesar de muito, mas muito singular mesmo entre as diversas experiências que a web 2.0 proporcionou para o universo musical expressa a potencialidade dessa nova forma de internet. Não há um ambiente hoje em que ela não tenha causado impacto. Universidade, escolas regulares, jornalismo, esporte, moda, publicidade, economia, política e por que não as religiões têm uma nova forma de atuarem. Aqueles que brigavam pela democracia e por poderem opinar se expressar nas décadas de 1960, 1970 e 1980, não poderia imaginar que a democracia, hoje conquistada, teria um aliado tão poderoso como web 2.0. Uma nova forma de se relacionar, de criar, de fazer política, cultura, economia e conhecimento.

Reencontro

Coisa comum é irmão mais velho ser a referência para os mais novos na infância. Bem, na verdade até hoje a Bruna, minha irmã, ainda é. Bruna era criança esperta, obediente, inteligente. Lembro de até me questionar porque ela era tão pretinha e eu não. Mas o que mais admirava era quando ela chegava da escola (eu ainda não estudava) cantando musiquinhas e meus pais adoravam. Afinadinha! E também quando Sandy e Junior tocava no disco e ela sempre ritmada, fazia passinhos bonitinhos. Já eu não nasci afinada. Nem tinha ritmo direito. Mas sempre gostava de ser aplaudida quando inventava minhas musiquinhas e cantava, mesmo desafinada. Minha mãe, de família musical (muito talentosa, por sinal) também insistia todo dia colocando alguma coisa pra me ensinar a dançar. De preferência "bada" ou lambada, meu ritmo favorito na infância. Na verdade eu não sei se gostava mais da lambada ou do vestidinho "de danxá bada".

Bem, a verdade é que a Bruna aos nove anos entrou no Coral Infantil da UCG, hoje PUC, onde meu pai é professor. Não preciso falar que eu não faltava uma apresentação e um ensaio. Minha mãe e meu pai foram se preocupando com meu envolvimento, afinal eu tinha certeza que assim que completasse sete anos, eu estaria ali dentro. Mas o obstáculo era um tal teste de aptidão. Meus pais acreditavam fielmente que dele minha desafinação não passava. Me enfiaram por um mês na casa da vizinha, que tem piano, e ensaiei repetidamente "parabéns pra você". Era a música que tinham pedido pra Bruna cantar no teste. Era março, como faço aniversário em maio, fui fazer o teste com seis anos mesmo. Sinceramente, não sentia a desconfiança dos meus pais. Talvez porque, abusada como sempre, eu tinha certeza que entraria ali no coral. Hãm, eu sabia todo o repertório! Já sabia até a postura de coral. Achei que isso era quase suficiente.

Se eu não estava tensa até então, não foi mesmo o teste que me deixou nervosa. Chegando na salinha do coral, na época bem pequena, me encontro com a tal Tia Elene, que já era minha tia também. Serena, com aquele jeito de lidar com gente que até hoje tento aprender. Sorridente me perguntou se poderia cantar "Atirei o Pau no Gato" batendo palma nos fins das frases. Tipo to-to, reu-reu, ca-ca. Não era parabéns que tanto tinha treinado. Mas deu tudo certo e ao fim, bem pedagogicamente, Tia Elene me pediu reservas e disse que estava impressionada com meu teste. Acreditei.

Foram onze anos no coral da Católica. Dos seis aos 17. "Carinhoso" foi a primeira música que aprendi. Cirandas também foi por aí que me ensinaram. Aos 10 fui desafiada a atuar, dançar e cantar com "A Magia de Monteiro Lobato". Dali, solo no Musical das Águas, quando comecei a viajar bastante sozinha. Depois entrei pro sexteto Musicanto. Foi quando cantar teve tom profissional. Por fim, até me rendeu viver experiência de atriz de cinema, no curta de Amarildo Pessoa "A Última Clareza".

Mas nada do que me aconteceu musicalmente e profissionalmente tem o mesmo impacto do que a formação humana que o coral, na pessoa da Tia Elene, me proporcionou. A verdade é que não dá pra pensar o que teria sido da minha vida, se não tivesse entrado no coral. E também não dá pra registrar tudo que vivi, aprendi, conheci nesse espaço. Encontrar a Tia Elene é uma sensação muito parecida com chegar em casa depois de uma longa viagem. Apesar do tia, ela teve papel de mãe, que cria, ensina e depois deixa o filho voar, ficando sempre de olho, mesmo que longe. Desde os meus 17 era sempre assim. Filho chegando em casa depois de viagem longa e falando como foi. Ou como está.

Quatro anos depois a moça que me ensinou a cantar lírico, mas também música popular brasileira, conhece o tal trabalho de coco que suas meninas estavam metidas. Ela gostou. Ufa. Assistiu, dançou, curtiu. Segunda passada, o reencontro. Sem timidez ou desconforto, eu e Bruna procuramos Tia Elene pra ajudar no vocal dos Passarinhos, que já não conseguimos mais avançar sem empurrão profissional. Sem pestanejar, com o mesmo sentimento de mãe, ela nos recebeu de volta na sala do Coral.

Acho que tá aí a graça da vida. Reencontrar. Que pessoas muito especiais passam por nossas vidas e que depois acabam indo, a gente aprende em cada página de frases de efeito na internet ou em livros auto-ajuda. Mas que vamos reencontrar e que elas serão especiais de novo não é certo. E quando acontece é talvez mais prazeroso do que se não tívéssemos nos afastado. Reencontrar uma música, um filme, uma cartinha, uma peça de roupa, um caderno. Não sou tão manteiga assim, nem tenho tendência a escrever coisas sentimentais e pensar sobre isso. Mas reencontrar a Tia Elene, o sentimento que vivi essa segunda, confesso, me fez refletir. Eu não só me reencontrei com ela, mas com minha infância, com minha formação, com meu aprendizado, minha história. Se não reencontramos, nossa história passa batido. Não paramos para lembrar como era. Mas, talvez, Walter Benjamin pode falar melhor sobre isso. Não me atrevo e já cansei as vistas do querido leitor.

sexta-feira, 26 de março de 2010

Diz que entrevista

Daniela Guirra, matogrossense de nascença, goiana de coração e paulista por curiosidade, tem o pé em todo lugar do mundo, de alguma forma. Por Goiânia ela está envolvida através de fatores como amizade, talento, negócios e oportunidade. Junto à Carla Hagemann, que um dia foi sua chefe-sereia, abriu a cabeça, o coração e um negócio. Cansaram de fazer estampas pra fora, produzir calças apertadas com strass na bunda pra deixar a mulher bonita. A idéia foi deixar bonito o que já é. Ser prática e adaptar a roupa à mulher do século XXI: que acorda, trabalha, vai ao mercado, cozinha, leva filho ao médico e depois ainda vai a um jantar romântico.

Mas mais do que produzirem roupas, elas, junto ao marido de Carla, o Amarildo, quiseram ter um espaço pra conversar, falar da vida, ter ideias, mudar o futuro, quem sabe e também, vendendo roupas e acessórios! Eis que surge o espaço Bangalô, com propostas diferentes, porém complementares: Balaque e Lord Dogs. Nesse domingo, 28, eles apresentam a ideia do espaço com desfile Lord Dogs e Balaque, além de show dos Passarinhos do Cerrado. Quer entender melhor? Vem comigo!

Entendendo quem é essa tal de Bangalô

Qual a proposta da “Bangalô”?

O nome lembra uma extensão de um lugar muito bom pra você ficar: um bangalô na praia. Uma coisa que caiba você, seu amor, seus amigos e pronto. Quisemos fazer um mega bangalô pra matar saudade, ler livro, comentar sobre um cd, ficar à vontade, como quando você fica em frente ao mar. Entrar no nosso espaço e se sentir fora e ao mesmo ao tempo dentro de um lugar que muita gente não sabe ou não está sabendo que está lá. Feliz, é isso.

Como se configuram Balaque e Lord Dogs dentro de uma única proposta? O que as aproxima o que as distingue?

Quando pensamos no espaço, que primeiramente não tinha nome, sempre tivemos muita vontade de ter um lugar pra chamar as pessoas que a gente gosta, que pudéssemos fazer parceria. Só poderíamos fazer isso fazendo o que a gente sabe: roupa. Acreditamos que a roupa pode comunicar muito, ela fala muito como você está, o que está vivendo. O que aproxima as duas não é o óbvio: uma é mais masculino e outra feminino, mas ambas, em públicos diferentes, em roupas diferentes, querem a mesma coisa: poder mudar algo, reunir as pessoas, que possam trocar informações, causar interação. Um espaço que pode ser mais do que um lugar que venda livros, roupas. O nosso objetivo maior é que as pessoas vão conversar lá, e saindo dali vão tocar a conversa em diante, mudar uma realidade. Uma coisa pequena que pode mudar o dia, o fim de semana. Desde uma música até uma proposta. Estamos sentindo nas poucas pessoas que freqüentam lá, que isso funciona.

Quem veste Balaque?

A Balaque surpreendeu muito. Inicialmente tínhamos a idéia que pessoas de 18 a 30 anos, no máximo 40 iriam gostar de Balaque. Mas muita gente foi gostando. Como deixar essas mulheres femininas sem deixar com roupa marcando corpo? Essa era a pergunta que fazíamos pensando na proposta Balaque. Não tenho como definir por faixa etária, tipo de corpo. Tanta gente se identifica, não é o tipo de marca que você fica esperando a filha provar alguma coisa pra ir embora. A filha prova e a mãe acha alguma coisa também, ou vice-versa. Todo mundo acha alguma coisa que quer. Já tivemos caso com meninas de 13 e de mulheres de 55 que se identificaram com algo. Eu tenho 24, Carla 43, e damos certo. A gente consegue um equilíbrio.

Como se identifica balaque na rua?

Você vai colocar a roupa e ela vai dar certo pra ir ao supermercado e também pra ir a uma super festa. Se fizer uma super produção, funciona. E se colocar só uma havaiana, funciona também. Ou seja, é a roupa dos nossos sonhos, que eu e Carla sempre quisemos ter no guarda-roupa. Atendo cliente e vou pro bar com a mesma roupa. Onde vou, me sinto bem. A gente é meio preguiçosa às vezes.

A balaque se identifica com a mulher século XXI. Mãe, mulher e profissional?

Claro! Vai ter reunião na creche. Ela está bem. Vai atender cliente. Está bem também. Vai ao mercado, está ótima. E ela não sofreu pra isso ao escolher a roupa, estava lá a Balaque no guarda-roupa.

Quem veste Lord Dogs?

Lord é voltado pro masculino porque quem desenha prioritariamente o Amarildo. Ele acredita na roupa, em cada peça que faz. Ele faz pra ele, realiza um sonho, mas quer que as pessoas usem isso também. As peças mais diferenciadas masculinas que existem no mercado são muito caras, e a Lord quer dar esse acesso. Ela propõe sair do básico. Os meninos também podem ousar. Também há um quê de transgressora, a linha da calça é neon e não é combinando com a calça. Ela pega o que é antigo, tradicional, como uma calça de alfaiataria, que nossos pais e avós usaram nos bailes, mas transformada em algo extremamente contemporâneo. Ela surpreendeu, pois vimos mocinhos conservadores começando a usar Lord, como algo mais justo, mais cavado. Quem nunca tinha usado, provou, identificou e comprou. Ainda não sabíamos como as pessoas reagiriam ao produto. Mas esse teste fez com que víssemos que a coisa pode ir mais além, e ir além do que a gente imagina.

Também é a coisa da mistura, acredita demais na reciclagem. Junta um pedacinho com outro e transforma numa peça incrível, com preço e visual muito bacana. Utiliza-se materiais não tão nobres, como o material de pneu utilizado para construir poltronas. Há uma pegada disco, rock. Achamos que ia ficar mais no universo masculino, mas atinge muita gente. O feminino está caminhando, mas nossa inspiração feminino pra lord são as meninas de blog. Essas meninas que têm seu blog, que colocam sua roupa que vai usar no dia, reciclam, garimpam muito, adoram um brechó. As meninas da lord dogs são mais montadas. Conseguem pegar uma peça chave da lord e transformar em mil coisas.

Como Bangalô se identifica com a cultura goianiense e com modo de vida das pessoas que vivem na capital?

Primeiro que pra quem vem de fora, sabe disso (meu caso, da Carla, do Amarildo): povo goiano é um povo do bem. Hospitaleiro demais. A gente sentia essa necessidade de chegar e poder freqüentar um lugar, até mesmo consumir, mas que não se sinta só como consumidor. Mas um lugar que as pessoas vão pra se sentir bem, conversar, acrescentar. A identificação mesmo com a cultura e pessoas daqui remete ao estilo de vida. As meninas, meninos, procuram algo leve, fácil de usar, porque é muito quente. Eu que vivi aqui, sei como é o dia-a-dia. Acordar e já estar calor. Pensamos no dia-a-dia dessas pessoas que moram aqui. Temos uma série de meninas recém-formadas e queremos muito vestir essas meninas, esses meninos, que estão acrescentando alguma coisa. Temos muito orgulho dessas pessoas que freqüentam aqui (risos).

Coleção outono-inverno

Quais os elementos que marcam a nova coleção?

A gente continua pensando a mesma coisa da primeira coleção: essas pessoas que vêm aqui, a gente já entendeu que eles querem vestir alguma coisa que seja prático. As pessoas estão sem tempo e sem saco pra se montar demais. A gente se baseou no que vivemos, o trânsito não ajuda, transporte também não e você tem que estar bem. Nosso inverno é ameno. A gente precisava pensar que não podíamos fazer nada pesado. Pensamos em algo que a pessoa pode tirar depois e carregar na bolsa. Não tem nada ‘surtado’ ou pensando em alguém que vá viajar pra fora do Brasil. Pensamos quem está aqui, que vive isso. Trabalhamos com texturas, misturando-as; veludo com renda, mantendo as malhas gostosas do verão passado, porque isso sempre dá certo em Goiânia e se torna uma peça atemporal. Todas as peças têm esse pensamento de você aproveitá-la em outras produções, ocasiões, com vários sapatos: voltado para praticidade sem deixar de ser feminino.

Quais as inspirações para criação da nova coleção?

Quem nos inspirou mesmo foram as pessoas que nós conhecemos e tudo que fizemos foi pensando nelas, que estão ao nosso redor, que são muito diferentes umas das outras. Conhecemos tanta gente diferente, e conseguimos fazer um panorama e definir que todo mundo pode ser feliz, que todos vão se identificar. A vida que as pessoas levam. Em todo momento a gente pensava. Será? Será que ela usaria essa manga? Será que esse comprimento faz sentido pra tal outra? Não que fizéssemos roupas específicas, mas pensamos na diversidade. Muita gente fazendo muita coisa. Nossa cabeça abriu muito.

Evento

O evento (desfile) consistirá em quantas etapas?

O evento se constitui em recepção, desfile da Balaque, depois da Lord Dogs, terminando com show dos Passarinhos do Cerrados apresentando do figurino.

Qual o objetivo do evento do dia 28?

O objetivo do evento é divulgar o Bangalô. Que as pessoas entendam que muita coisa pode acontecer dentro desse espaço. A gente acreditava que ia ser só nosso esse espaço, mas vimos que faz sentido pra muita gente e a gente viu que deveríamos fazer uma extensão desse nosso universo mostrando o que podemos fazer. A gente espera que as pessoas se divirtam, porque a gente quer se divertir.

A partir do primeiro desfile, quais efeitos esperam em relação ao desenvolvimento da Bangalô?

Tem muita gente se envolvendo, agregando, quase um movimento Bangalô. Isso tem acontecido desde a organização. A gente espera que as pessoas apareçam pra passar a tarde com a gente. Queremos que isso realmente se concretize, realize: que as pessoas se reúnam, conversem. Depois disso, aí sim, as coisas vão começar e vamos pensar “a gente não tava louco em pintar uma casa inteira e pensar que as pessoa vão lá passar tarde com a gente ao invés de assistir ao Faustão”.

Vestindo Passarinhos do Cerrado

Como surgiu a idéia de criar um novo figurino para o grupo Passarinhos do Cerrado?

Vontade, no meu caso, tive sempre. Há dois anos e pouco conheço a Carla. E desde que conheço Passarinhos, eu falo deles pra ela. E só quando ela assistiu ao show que foi entender o que eu estava falando e arrependeu de ter demorado de mais e não ter dado importância devida. Ela visualizou que tinha muito da gente na organização dos Passarinhos, na luta deles, a gente vê que eles acreditaram em alguma coisa, ninguém fazia daquele jeito e foram. Felizmente estamos andando junto: música, moda, design. Eu nunca soube definir o que era, e hoje vejo que foi uma identificação de desejo, de luta, fazer alguma coisa que ninguém fez ainda. Apostar, botar todas fichas, e fazer a coisa funcionar, isso que valeu. A gente fica muito honrada de fazer esse figurino.

Qual o conceito do figurino?

A coisa saiu da cabeça da Carla, eu palpitei, interferi, mas a ideia veio mais dela. Pelas nossas conversas o conceito é regional. Ficou muito claro que deveríamos pensar nas necessidades enquanto grupo: que se move, sua, precisa estar com algo confortável. Aconteceu uma identificação com as roupas Bangalô: algo que funcionasse. Se precisar tirar foto e receber alguém no camarim, você está linda ainda. Nossa inspiração tem algumas coisas subentendias: as cores de algumas árvores do cerrado, como ipês, mas algo sutil. Passarinho adora flor, árvore, então o item mesmo é muita flor nas meninas. É um conceito extremamente simples, mas diz muito sobre a banda, tem que ser alegre, porque depois que você vai a um show realmente, ou 300 mil como eu, você vê como as pessoas ficam felizes, quem não viu fala: como não vi antes. E quem já viu está se debatendo louco, dançando com desconhecido, aprendendo a dança. Ter acesso a alguma coisa que simplesmente não tinha aqui. Poderia ter outra banda com os mesmos instrumentos, propostas, mesmo assim não teria nada a ver. Compromisso com praticidade, com que funciona.

quarta-feira, 10 de março de 2010

Stop, read, think

"Watch your thoughts
They become words
Watch your words
They become actions
Watch your actions
They become habits
Watch your habits
They become your character
Watch your character
It becomes your destiny"

Unknown writer

terça-feira, 9 de março de 2010

Um post inútil

Como eu sei que meu ano começou mesmo e que comecei já a ter uma vidacheia a la nadiawayoflife?

1. Consumo de coca-cola aumenta
2. Consumo de água e cerveja diminuem
3. Esqueço de comer
e quando lembro...
4. Fico louca numa porcaria
5. Faço menos carinho no Dalai quando chego em casa
6. Arrumo briga à toa com namorado
7. Escrevo mais na agenda (tentando organizar o tempo) do que no caderno durante a aula
8. Aumentam os meus 'nãos' pra sair e pra tomar cerveja
9. Sinto que ficar em casa é quase luxo
10. Meu celular vive cheio de lembretes

E, agora, vamos ao que interessa, que blog é que não é.

sexta-feira, 5 de março de 2010

Uma aula que incomodou

Esse semestre vivo uma situação, digamos nostálgica, mas que acabou me causando preocupação mesmo. Estou tendo aulas na Filosofia com o professor que me deu aula no primeiro semestre de faculdade. Bem, a verdade é que ele me fez lembrar que eu estou no 4º ano de universidade (não necessariamente que vá formar esse ano, ok? Deixo isso pra 2011). Isso quer dizer que eu, supostamente, deveria dominar sobre juízos analíticos, soberania, moral, eu-trascendental, biopolítica e todas essas coisas. O que não ocorre. Mas, por outro lado, estar de novo com ele em sala, me botou pra pensar e pra recordar.

Você sabe quando sente cheiro de algo ou ouve músicas que te fazem lembrar exatamente de um determinado espaço/tempo? Isso aconteceu quando ouvi aquele vozerão grave do Wagner (professor). Lembrei do meu all star verde, das inúmeras cervejas na pamonharia com os novos amigos, das farras com os antigos, que hoje estão fora de Goiânia, dos meus tempos de teacher no Chicago. De quando eu tinha tardes livres para passar na biblioteca resolvendo os exercícios de lógica e do dia que fui ao quadro resolver um, acertei e fiquei feliz a ponto de até hoje não ter esquecido disso (o bicho pegava nessa disciplina!).


A verdade é que eu não tinha nem ideia do que era estudar filosofia. Nem pra quê isso serviria. De lá pra cá duas coisas aconteceram, de relevante. Pro desgosto de Wagner, eu não continuei a estudar lógica nem nada parecido. Minha grade é escancarada (diferente de aberta) o que me fez optar majoritariamente por disciplinas de filosofia política, por afinidade (descobrir o que se gosta em filosofia é uma grande coisa, demorei 1 ano e meio). A outra coisa é que estudar filosofia por três anos não me fez palpitar sobre fenomenologia, provar a existência de Deus, muito menos ganhar muito dinheiro. O efeito mais visível e denso até agora é um: eu fiquei muito chata e exigente. Ela te faz duvidar ou criticar (mentalmente, tb não fico verbalizando) quase tudo que se ouve por aí. E se os meus conselheiros falavam que a filosofia ia 'me ajudar' no jornalismo, ela, muitas vezes, me deixa é muito irritada com o que temos nessa área.


Ok, tudo isso pra falar da aula magna que tivemos no jornalismo na quarta-feira. Bem, o tema era: "Universidade: o caminho rumo ao sucesso profissional". Minha mãe e meu pai, nascidos de pais que não tinham nada pra deixar pros filhos ficarem brigando e da geração que começava a ralar cedo, precisavam da universidade para ter futuro profissional. Juro que não quero dispensar linhas falando dos novos passos pro sucesso, além de meramente estar na universidade. As livrarias estão cheias de best-sellers pra isso. Mas, sinceramente, ter ideia de que universidade serve para se ter sucesso profissional, e só, é coisa do século passado. Acho que quem sugeriu esse tema deve ter adorado a mudança de UCG para PUC, afinal, os curriculos vão ter mais uma estrelinha e isso é ótimo pros futuros profissionais. Mas ela não sabe que o que fez a universidade tornar-se PUC foi justamente o tripé: ensino, pesquisa e EXTENSÃO.

O Jornalismo dá passos de formigas para se desenvolver nisso, atuando hoje somente com projeto Ciranda e Semana de Cultura e Cidadania da universidade. Se há outros e não estou sabendo, identifico aqui outro problema. Não vou ser cruel e, de forma alguma, extender a crítica à PUC, que tem realizado e crescido muito em extensão. A Semana de Cultura e Cidadania não me deixa mentir. Mas, inevitável comparar. Enquanto a aula magna do jornalismo tem esse tema e chama ex-alunos recém-formados para mostrarem o quanto estão bem sucedidos aos 25 e falam o que temos que fazer para ser iguais a eles, o DCE da UFG convida Dom Tomás Balduíno para uma palestra com tema "A ciência em debate: por uma universidade popular". Ano passado o tema era "Universidade para Comunidade".

Agora em março começa um curso de especialização que é resultado da parceria entre UFG e Pontão de Cultura República do Cerrado. O objetivo é capacitar as pessoas que atuam nos pontos de cultura e a longo prazo pensam em capacitar também quem não tem graduação, realizar festivais, feiras, ou seja, extender mesmo a universidade à sociedade. Os projetos de incubadoras da UFG também estão aí pra provar que ela valoriza extensão, os alunos estão envolvidos e as ações interferem mesmo na sociedade de maneira afirmativa.

Bom, na verdade eu espero que em poucos anos o jornalismo da PUC possa fazer uma aula magna com tema relacionado à extensão e chamar para compor a mesa alunos que tenham a falar sobre a experiência de certo projeto de extensão que tenha trabalhado, e não quantos 10's tiraram e monitorias deram para que conseguissem chegar à redação de não sei aonde ou direção de marketing de não sei que empresa.

sexta-feira, 26 de fevereiro de 2010

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte final

Quarta de cinzas. Que tristeza que deu. As pessoas tinham ido embora. As ruas estavam vaziiiiiias, perto do que tinha sido. Os trompetes tocavam meio isolados. Me deu certa melancolia. Passou tudo tão rápido! De manhã fomos no mercado do Recife. Você sabia que é o mais antigo da América Latina? Nem eu. Lembranças pra quem está em Goiás, minha mãe e Paulinha acharam que o mundo ia acabar em artesanato, Tia Clara em colar. Mas eu juro que não suportava mais o cheiro de mer** daquela cidade.

De tarde fomos atrás do tal do bloco dos artistas que tocaram no carnaval. Eu mesma não vi um nesse bloco. Mas pelo menos acompanhei um bloco por um bom percusso no carnaval. O abusado do Rodrigo foi até o fim tocando a caixa de alguém que ele tomou. E além disso vi o Siba pelas ladeiras (suspiros, rs). Na prefeitura, parecia ser terça, segunda, domingo ou sábado de carnaval. Mais umas rodadas por uns blocos, assistimos a uma apresentação do tal do 'boizinho' e fomos pra casa (aquele ritual) pra voltarmos para vermos mais delas.

Bruna tinha sido pega pela doença ruim de Pernambuco. Tava acamada. Miti e Paulinha há dias também estavam no mesmo (super) pique que eu. Bem, a verdade é que o colchão, a novela, as baboseiras, o cochilo pegaram nós quatro. Mas foi muito divertido. Sabe, quando se ri à toa? Quando há uma sintonia sem motivo? Foi isso. Perdemos Quarteto Olinda, os boizinhos, e ganhamos horas de sono. Afinal, quinta-feira nunca foi de carnaval, era hora de voltar pra casa e encarar que 2010 começou. E tá aí, louco pra me engolir.

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte V

Segunda foi dia de praia. Porto de Galinhas o destino. Bem, acho válido lembrar e fazer uma leve propaganda aqui. Ir pra Recife, significa estar ao lado de Olinda, 50 minutos de Ilha de Itamaracá, 1h20 de Porto de Galinhas, mais 20min chega em Ilha do Carneiro. Além de 1h30 pra cima e você está em João Pessoa. Chega um poquim mais pra riba e está em Natal. Ainda não tive oportunidade de conhecer tudo, mas quero um dia. Bem, aproveitamos disso, alugamos van, enchemos de gente e fomos pra tal de Porto de Galinhas.

Bem, particularmente eu achei Itamaracá bem mais bonito. Mas, confesso que vacilei, quis dormir um pouco antes de ir desbravar a praia e quando é fé (adoro essa expressão goiana, muito utilizável) a fila estava gigaaante para pegar jangada para as piscinas naturais. Mais um pouco, muito vento, e as jangadas nem sairam mais. Bem, não conheci as tais piscinas. Fiquei ali naquela aguinha quentinha, sem onda, azulzinha, me refrescando. Quero destacar que há muito tempo não ia minha família toda pra praia. Isso é algo importante na vida de uma família de classe média (rs). Bem, no mais... repito, praia é isso aí. Voltando pra casa, minha amiga indisposição me chamou pra ficar com ela em casa e deixar de ir assistir ao show do Eddie no Fortim. Prontamente, aceitei seu convite.

De noite fomos no Recife na tal noite dos tambores silenciosos. Em 2009 choveu muito, tinha água suja, nojenta, até o joelho. Mas achei tudo lindo. É uma celebração com uma pegada candomblé e muitos grupos de maracatu. Vejam só, essa vez, até a gente conseguir chegar no local, andamos muuuuuuito. E fedia demais! É muito descuido com saneamento básico, com higiene. Vocês vejam como fiquei enjoada de um ano pro outro. Em um, não me importo com água de esgoto no joelho e muita chuva. No outro, não aguento nem o cheiro. Meu pai, tadinho, andava dando ânsia e apelidou, carinhosamente, o estado de Pernambucoco. Minha mãe é assim: adora muvuca de Olinda, aquela coisa que nao dá pra se mover. Mas em Recife não gostou. Resumindo, essa noite foi meio fracasso. O fedor e a muvuca nos repeliram da cidade. Ok, meu paracetamol me esperava em casa.

Terça. Pois é, terça é mesmo o último dia mais movimentado de carnaval. O carnaval começa bem antes, mas quando ele acaba, acaba mesmo. Quando chegarmos na quarta explico melhor sobre isso. Mas terça já tinha um ar de despedida, apesar de ninguém da casa ainda estar indo embora. Nesse dia totalizávamos 8 doentes na casa. Juntamos eu, Artur, Ayana (namorada) e Paulinha e fomos juntos tomar um soro no posto pra conseguir subir ladeira. Ayana assustou com ambiente e correu da agulha. Eu, Pablita e Tutu ficamos ali, com soro na veia! Competindo quem acabava primeiro. Paulinha ganhou, mas teve que voltar pra tomar mais. Eu e Artur tivemos alta. Não vou esquecer da frase da Paulinha: "Ê, gente! Antes estar aqui pra tomar glicose, né?". Né? Carnaval a gente espera esse tipo de coisa. Soro não!

Botamos nossos abadás e fomos pra rua. Muita gente, muito bonecão, muito frevo, muito confete. Daquele jeitinho que descrevi na parte I. Uma pausa no restaurante oásis no meio de Olinda, nos livrando de fedor, barulho e muvuca. (Engraçado, quando você tá curtindo não há fedor, o barulho é som, e muvuca é gente). Mais umas perambuladas por Olinda (que a essa altura do carnaval fedia demais!).

A noite, no Pátio São Pedro, que guarda seu charme a aconchego, me reservou grandes emoções: show da Renata Rosa. Bem, assistir ao show dessa cantora é muita emoção na vida de uma coquista. Mári que o diga que chorou o show inteiro. Fiquei na frentinha. Eu não queria nem cantar muito as músicas junto pra admirar mesmo cada voz. Nem dançar muito coco, pra não perder nenhum movimento das performances, do jeito de tocar daquele grupo. É, Renata Rosa é a estrela, mas ela tem várias estrelinhas em palco que ganharam minha admiração. É... muito lindo e ali era uma das coisas que faziam valer minha viagem. Dali, show do Original Olinda Style no Recbeat. Maciel Salú, Eddie, Orquestra Contemporânea de Olinda. Que sonzera! Mas lá veio a chata da minha amiga indisposição me chamar pra casa. E fui. No outro dia era o menos desejado pelos pernambucanos: o último (?) do carnaval.

quinta-feira, 25 de fevereiro de 2010

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte IV

Domingo, mais uma vez, eu estava muito indisposta. Enquanto as pessoas iam ficando na casa, eu ia também. A partir desse dia foram aparecendo mais doentes. Uns com sintomas parecidos com meu, outros com gripe, outros com 'piriri'. Preocupei com isso, na verdade. A casa já estava num ritmo um pouco lento, por fim, sempre o grupo estava desfalcado. Juro que nesse dia quis subir ladeira com meus pais, minha irmã, minha tia. Mas fiquei com a cama e meu paracetamol. Mais tarde vestimos nossos abadás (sim, nem vem, era abadá) e fomos pra rua. Na verdade pessoal ficou pra trás, fomos eu e a Paulinha, encontramos meus pais, ficamos ali admirando a muvuca. Por curiosidade, fui no posto de saúde. Tava ali perto mesmo. Muita gente com coma alcóolico e outras cositas más. Fui abrir meu coração com a médica sobre nossa situação e em particular a minha. Fiz o tal exame do laço, ela ficou confusa no número de pintinhas vermelhas, mas escreveu 'dengue' no papel e me pediu exame de sangue. Essa informação, em pleno domingo de carnaval, foi segredo (meu) de Estado até quarta. Não acreditei, fingi que não era comigo e depois do passeio, uma cama, um banho e um paracetamol antes da noite.

Sim, DA noite. Eu levantei, sabendo que estava sendo teimosa. Tudo doia, muita vontade de deitar. Mas sabe, era Pandeiro do Mestre, Coco Raízes e Jorge Ben Jor. E sou uma proletária, férias não é coisa que se tem todos os dias. Muito menos dinheiro pra chegar até Pernambuco. Eu sei dar valor às oportunidades. Os shows aconteceriam num pólo descentralizado chamado Nova Descoberta. Em 2009 falaram pra gente não ir, que seriamos assaltados com certeza. Esse ano resolvemos ir. O táxi foi se enfiando nos morros. Goiânia não tem favelas, tem periferias. Eu nunca tinha entrado num morro. Eu nunca tinha visto uma pobreza assim, de perto. Digo os botecos, as ruas, as casas. Era morro mesmo. O taxista chamou de 'favela urbanizada', que nem ele sabia chegar direito. Mas chegamos e sinceramente, o melhor polo que fui no carnaval! Muito grande, muito ar (precisa-se em Recife, tudo fede muito), muita família, muita gente que tava ali pra brincar carnaval. E tinha mesas e cadeiras, o que era ótimo caso eu não conseguisse mais curtir show de pé. Mas esse dia, ignorei mesmo a indisposição. Eu e meu paracetamol dançamos muito no show do Pandeiro do Mestre. Foi quando Reizim me disse: "Nádia, jajá a gente sobe!" e riu. Eu ri junto, pensando: "Ah tá!". Mais um tempo, Rodrigo: "Bora, Nádia! Vamos subir". E a gente subiu mesmo.

Tocar Coco de Goiás num pólo de carnaval numa favela em Recife, Pernambuco, berço coquista. Eu não sabia medir a emoção. As carinhas de orgulho dos amigos lá embaixo. De surpresa dos pernambucanos. De deslumbrados dos passarinhos. E de carinho dos membros do Pandeiro. Era muita gente, foi muita emoção. "Estão batizados", bem disse João com todo seu sotaque, produtor do grupo. Depois vem um pouquinho de Coco Raízes. Eles chegaram atrasados e tocaram pouco. Mas nunca os vi tão deslumbrantes. Eu tava apaixonada! Sensibilidade à flor da pele. Mas estava tudo redondamente perfeito entre eles em palco. Mas logo eles sairam pra dar espaço pra Jorge Ben. Desde junho, quando ele se apresentou no festival de inverno de Brasília, que não fui, mas toooodos meus amigos foram, eu queria muito ver um show! E vi, finalmente. De pertinho, bem espaçoso, tranquilamente. A noite já tinha valido. Ou não? Fomos convidadas pra dançar em palco com ele: eu, Bruna, Luanas, Izabela, Mariana, Paula... e fomos! Foi divertido, engraçado. Um pouquinho de vergonha (sério). Mas adorei dançar forrozinho com ele. Tá na história. Bom, tá bom por domingo. Hora de cama e paracetamol!

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte III

Quinta-feira é o dia do lançamento oficial do Carnaval de Olinda. Sabe? Muito importante na vida de uma foliã de Goiânia. Fui pro Alceu Valença fingindo que meu corpo doia do forró e a indisposição vinha da ressaca. Mas estava muito cheio. Muito mesmo. Mais do que no ano passado. Era o caos, na verdade. Não conseguia chegar no lugar. As ruas eram divididas por táxis, ônibus, gringos, locais, ambulantes com batatinha ou cerveja, mendigos e pessoas doentes em cadeiras de roda. Isso me deu agonia, por um momento, mas cheguei no Alceu. Fiquei meio longe, muito apertada, comprei um latão, corpo amoleceu. Pensei: não vou conseguir assistir ao Mundo Livre. Corpo foi doendo mais, mal-humor foi subindo, larguei latão e pensei: acabando Alceu, assim que minha mãe ligar pra alguém ir recebê-la na casa eu vou. Mas aí não tinha mais graça nenhuma o show, nem as pessoas, nem latão e eu tava mesmo passando mal. Foi quando fui pra casa. Pijama e cama: preciso dormir, pensei. Minha mãe chegou, toda eufórica, me abraçando. "Nááááádia, você tá pelaaaando de febre! Banho frio já". Ela revezava sua preocupação comigo com seus goles na cerveja que tinha pego no freezer. Na verdade, assim foi até o fim do carnaval, incluindo que eu disputei atenção com os blocos de Olinda. Coitada da minha mãe. Custo a tirar a mulher de casa, botar pra viajar, fazer farra e a filha adoece. Ainda bem que ela não fez disso um impecilho pra curtir a viagem.

Bem, a partir daí veio muito paracetamol, muita água, soro, água de coco e cama. Muito suor, muita indisposição, muita dor de cabeça, boca amarga. "É, dengue!", uns diagnosticaram. Vontade de ficar na cama. Vontade de ficar deitada. Vontade de nem sair dali. Foi assim sexta. Dinterim. "É insolação!", minha mãe tinha certeza. Acreditei em mamãe e não levei isso à sério. Descansar sexta, porque sábado a programação tá quente! Tentei ir na abertura do carnaval de Recife. Naná Vasconcelos e os 700 batuqueiros de maracatu. Sabe, não vi graça dessa vez. Não é microfonado, você não ouve direito, não enxerga a emoção, nem sente o batuque. Achei que era mau-humor meu, mas muitas pessoas concordaram. Uffa. Pessoal esse dia foi pra casa onde turma do Coco Raízes de Arcoverde estava hospedada e aprenderam a dançar as tamancas. Essa eu perdi mesmo.

Sábado acordei melhor. Sabia que não tinha sarado, mas queria me convencer disso. E principalmente os outros. Fiz almoço, me banhei em protetor; dá-lhe chapéu, óculos e rua! Blocos, blocos, alto da Sé, Coco Raízes, Pólo do Samba e até umas cervejinhas. A noite caiu, minha energia tb, a febre subiu. Era a hora do banho, cama e paracetamol. Perdi Coco do Amaro Branco, atravessei a rua onde casais gays se pegam em Olinda rindo do moralismo da mãe e da tia, e fui pra casa. 23h levantei. Digo, eu, minha vontade, meu espírito. Meu corpo queria ficar ali na cama mesmo. Fingi que não era comigo, tomei meu paracetamol e fui pro Siba! Não era Marco Zero, não estava lotado, o que já garante um show mais agradável. Ah! Importante! O táxi chegava perto! Em Olinda se anda MUITO. Mas muito mesmo. O táxi te levar na boca do palco em Recife é luxo. Depois de Siba e a Fuloresta, deixei Jorge Ben Jor pro domingo. Minha saúde não me permitia infinitar. Papai, que tinha acabado de chegar em Recife, não reconheceu o desânimo da filha quando o encontrei em casa. Ele, nem eu, só não sabíamos que eu continuaria quietiiiiinha!

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte II

Em 2009, fato, o carnaval me impressionou e encantou mais. Mas, toda primeira vez tem seu valor único. Eu não conhecia nada. Eu nem tinha ideia de nada que me esperava. Foi quase como quando fui pela 2a vez à praia (a primeira eu não lembrava, nem de mar eu gostei), para Bahia, e só imaginava um coqueiro e um mar de desenho. Tudo foi tudo muuuuuuito mais legal, claro.
Bem, eu não sabia que o povo pernambucano era tão cultural e tão simpático. Também não sabia que TODO MUNDO MESMO participava do carnaval. Nem que ele era tão importante na vida da cidade. E também não tinha ideia do que era um carnaval popular - do povo, para o povo, pelo povo. (Ai, que fala política bonita).

Na verdade eu não tinha idéia que os caboclinhos significavam apresentações bem coloridas e ritmadas indígenas. Nem que o maracatu rural tinha um ritmo tão legal e os caboclos eram tão bonitos. Eu nem sabia que tinha dois tipos importantes de maracatu, pra falar verdade! Não tinha ideia que ia me encantar com aquela família real. Muito menos que tinha 9283091283 apresentações dessas por dia! Os blocos de frevo... hmm... okay. Talvez eu soubesse que tinham muitos. Mas não tantos. E o frevo, certo, é lindo! Mais lindo é ver todas as crianças dançando. Mas aquele 'pananananãããã', de fato me 'aperriou'.

Sabe, gente. Eu sou de Goiânia. E nossa cidade, bem... minha irmã está certa, ela é uma cidade do interior grandona. Eu nunca fui acostumada a ver tanto show de gente tão legal em tão poucos dias. Deslumbrei. Falei. Lenine, Maria Rita, Nação Zumbi com Siba e a Fuloresta, Caetano, Naná Vasconcelos, Alceu Valença, Elba Ramalho. Agora, ver os grupos de coco que eu só conhecia de ouvir, juro que nem de ver; entender o que É o coco, culturalmente falando, praquele povo. Meu Deus. Muita emoção musical e antropológica.

Mas, afinal, é pra falar do carnaval 2010, né dona Nádia. Bom, a verdade é que sai de lá em 2009 com a certeza de voltar em 2010. E eu tenho a chatice ou virtude de ficar tentando convencer as pessoas a compartilhar comigo o que EU acho muito legal. Os Passarinhos também, na verdade. E por isso esse ano, foi diferente! Pai, mãe, irmão, namorada dele, tia, amigas, amigos-parceiros dos passarinhos, passarinhos (menos a sem graça da Iúna).. enfim! Éramos 17! Talvez dedicaria umas linhas pra falar do prazer que é viajar com a Michelle, ou companheirismo que é estar com a Paulinha ou do fogo-no-rabo de mamãe em Olinda. Mas são 17 pessoas e não dá.

Bem, quarta-feira, já éramos 14. A cidade já estava em carnaval. Claro, ela estava desde o reveillon. Mas sabe, ir em frente à prefeitura, os mamulengos acabando de serem montados, os blocos já estão nas ruas, os bonecões também, e claro, os latões skol a R$2,00 (saudades, Pernambuco!). Eu tava mais feliz de estar com aquelas pessoas ali, e ir mostrando as coisas, porque eu, muito abusada, sempre me sinto uma local nesses lugares. Ver o mar de Olinda. Ah, o mar de Olinda! Maravilhoso do Alto da Sé, muito fedido e feio do Fortim, e perigoso de qualquer praia por ali (tubas... os tais tubarões). De noite, chegamos atrasado pro show do Siba. Sem chorar, sábado tem mais. Bem, pelo Fortim (não leia fortxim, que nem goiano, mas fortim, com tê de rato), onde acontecem principais shows de Olinda, a coisa ainda tava transitável, você podia ficar perto do palco e logo de entrada: SpokFrevo. O jáz (jazz, como eles falam) com frevo; o erudito mais popular que há. Os metais com maior malemolência do mundo. É de ver, de bater palma, de dançar, de babar. E o Carlinhos Brown depois... bem, aquele seu axé, seu cocar, e seu repertório tribalistas me fez correr pro Xinxim da Baiana. O forró de toda quarta-feira com Quarteto Olinda.

Sabe aquele CD furado de tanto ouvir? Eu sou péssima em decorar letras, mas juro que sei muitas do Quarteto Olinda, e melodia de todas. Sabe ter muita vontade um ano todo de um forró daqueles. Pois bem, eram eles, ali, no lugar bem aconhegante. Até dar meia noite e não parar de entrar gente. Chegamos, estava vazio, encontramos alguns coquistas conhecidos e me senti em casa. Tirei a sandália e rodopiei o salão inteiro. Eu me entreguei ao forró, ao chão sujo, à rabeca, e até a porcaria da cerveja Nobel, que me rendeu ressaca na Ilha de Itamaracá no outro dia. A ilha é linda. Mesmo. Ainda mais depois de dormir um tempo por lá, beber uma coca, superar a ressaca e começar o dia.

Praia não tem muito o que falar né. Pensou? É isso aí. Mas tem algo diferente que quero falar. Imagine alguém que vá pela primeira vez ao Rio, em Ipanema. Lógico que pensa: imagina o Tom Jobim aqui, sentado ali, bebendo, falando de mulher e compondo. Você nunca veria isso. Óbvio. Mas imagine só. Ouvi a palavra Itamaracá pela primeira vez nas cirandas de Lia. Seria demais ver a Lia, na praia em Itamaracá com crianças coloridas dançando ciranda e ela cantando né? E não há de ver que a dona Iemanjá tava lá, desse jeitinho, gravando pra Band. Sensacional. Mas minha disposição toda, aquela menina esbanjando energia começou a mudar no início da noite dessa quinta. As dores nas pernas pareciam não corresponder ao tanto de forró da noite anterior. A indisposição não batia com a ressaca que já era pra ter passado. Mas foi nessa noite mesmo que descobri que não era dor de forró, nem ressaca.

Meu carnaval pernambucano com paracetamol - Parte I

Blog, querido blog. Como te evitei, não é mesmo? Mas o tempo passa, a gente acaba se aproximando mais de ser jornalista e se afastando de ser estudante e certas coisas devem se tornar hábito, simplesmente por escolha de vida. Talvez se eu tivesse resolvido ser nutricionista ou quem sabe administradora, isso não tivesse que fazer parte do meu ofício.

Deixando de lamentação e sem soar como obrigação escrever aqui, apesar de meu 2010 ter começado com muitas coisas interessantes a serem ditas (sejam coisas em minha cabeça, sejam fatos externos) vou falar do Carnaval em Pernambuco 2010. Pausa. Você deve ter pensado em muita cerveja, muito colorido, muito confete, muito frevo, muita bagunça, muita gente, muita ladeira, muito sol, bonecos gigantes. Pois bem, carnaval em Pernambuco tem disso mesmo, e tem mais, e no meu caso, o meu foi diferente. E quero falar do início da viagem. Início de começo mesmo, assim do aeroporto.

Sim, acho digno falar do aeroporto e de 'andar de avião'. Eu gostaria de nunca me acostumar e perder o encanto em 'andar de avião' (eu gosto de falar essa expressão, acho bonitinho). Gente, por mais que nossa rodoviária seja melhor que nosso aeroporto, viajar de avião é sim muito mais dignidade. Não só pelo tempo. Você não é tratado da mesma maneira num check-in ou embarque, que num balcão de rodoviária. (Apesar de ter ficado admirada com a rodoviária do Rio nesse reveillon). Aeromoças parecem anjos! Pela beleza e pela educação. (Apesar de nunca entender porque refrigerante vem sempre quente e com gelo). Tudo funciona, deve ser uma das únicas coisas no país que você tem que ser pontual, porque eles não vão arrumar um jeitinho. Tudo dá certo, mesmo porque quando dá errado... bem... que bom que deu tudo certo comigo.

Mas o que eu queria falar, dessa vez, é que tive uns pensamentos diferentes. Além do pensamento corriqueiro: 'como esse trenzão consegue sair do chão', tive alguns outros naquele momento de decolagem e que a gente de repente enxerga coisas que nunca enxergaria com pés no chão. Primeiro fiquei lembrando do Lula falando o quanto obras paradas dão prejuízo pro país. É... como estagiária de vereador me senti na vontade de cutucar pra que a gente faça algo pra que aquele aeroporto, de uma vez por todas, seja digno de sua capital.

Depois eu fiquei pensando como eu não me sinto na vida real dentro do avião. Daí o aeroporto seria o limbo. Quando entro em uma pra viajar (e não receber ou mandar gente embora), eu me sinto saindo da vida real, porque, de fato, estou saindo da rotina (ainda não sou jornalistabemsucedida que viaja a trabalho). E sinto também em todas as pessoas por ali. Mas quando eu finalmente estou no ar, eu tenho certeza que estou fora. Eu saio da vida e caio direto no Google Earth. Aqueles carrinhos lá embaixo, pra onde estariam indo? Aquelas casinhas... que que as pessoas fazem ali? A GO que segue pro Campus, simplesmente parece que aquilo não me pertence, que nem por ali eu passo todos os dias. E quanto mais se distancia, menos vida eu sinto, menos rotina, é tudo mapa, e finalmente estou fora.

Voltando pro limbo, dessa vez em Brasília, me deparo com um lugar muito cheio. É muita gente. De todo jeito. Gente com cara de político, de empresário, de jogador, de funcionário público, de emergente, de estudante, de nada... sabe, gente com cara de nada? Que vocês fazem aqui em plena terça, ein gente? Tá todo mundo de férias que nem eu? E você, ein tio. Todo de terno indo pro Rio em semana de carnaval? Uhum... tá! Não demora muito, depois daquelas coxinhas caras e horríveis, que insisto em comer, tive o imenso desprazer de me sentar ao lado de um garoto carioca de 15 anos que me importunou até Recife. Não, não é uma viagem rápida. E vocês não imaginam o meu prazer e facilidade em dormir em viagens. Daí imaginem o desprazer em ter alguém, como descrito acima, puxando papo comigo. Eu, que levo até travesseiro pra dentro do avião.

Juro que nunca me incomodei em parecer 5 anos mais nova. Ou mais. Mas quando comecei a reparar que o pirralho me confundiu com alguém da idade, e estava dando em cima, importunando meu sono, ah... eu me irritei. Mas e quando ele descobriu minha idade, que eu namorava, e continuou a me importunar? Aí concordei que carioca é abusado mesmo!E ainda era evangélico. Ahan, tá! Lembrei da minha amiga Débora, deveria ter usado a frase que ela tanto gostava de falar quando ele falava alguma abobrinha. "Olha, eu penso assim, não sei os crentes". Bem, chamaria a aeromoça pra trocar de lugar, se eu não soubesse usar, oportunamente minha grosseria. "Qual parte do eu-quero-dormir você não entendeu?". A parte do 1h30 depois de me deixar em paz, antes de descer do vôo, tirar uma foto minha. Bem, eu só queria desabafar, talvez. Vamos para o carnaval!