domingo, 18 de julho de 2010

Salve, Mandela!

Eu não sabia que hoje era aniversário do Mandela. E sem saber, bem na virada do aniversário dele, às 0h de ontem coloquei o tão comentado Invictus para assistir. Já vou falando que não sou crítica de cinema, não vou falar da fotografia nem da direção com propriedade. Se estiver esperando isso, pode ir fechando essa guia. Mas, gosto demais de filme. Gosto tanto que não gosto de ler a sinopse de filmes recomendados para eu me envolver mais ainda quando assistir. E eu não li a do Invictus. O que, com certeza, tornou o filme uma surpresa maior ainda. Quando se fala em filme de Mandela, logo pensei que viria toda aquela história dura e triste dos 30 anos na prisão, da violência moral do Apartheid, da trajetória bonita e humilde do Mandela. Nada disso. Em partes, fico com parte da trajetória política e humildade.

Último filme que assisti de Eastwood (esse inclusive ele foi ator, além de diretor) foi Gran Torino. Achei sensacional. Um filme baratíssimo e muito emocionante. O final é totalmente imprevisível e inimaginável. O oposto de Invictus. O final é totalmente previsível. Mas o que diferencia o filme é justamente uma direção que pega um roteiro, na minha opinião, simples e o torna um grande filme e que fale de Mandela muito mais que qualquer filme meio biográfico. Um recorte muito, mas muito pequeno de tudo que Mandela representou e representa e que com certeza fala muito dele, expressa muito quem foi essa figura e como ela mudou a história da África do Sul. E aqui, quero registrar a importância da interpretação de Morgan Freeman. Ele segura qualquer filme, até aquela porcaria de "Antes de Partir" . Mas vou dizer que nesse filme ele conseguiu atingir minha admiração mais profunda. A difícil sutilidade em ser Mandela. E ele conseguiu com toda costumeira competência.

O limite entre mostrar a inteligência de uma ação de um líder político e a ação de um super-herói extraordinária é muito pequeno. E acredito que o filme poderia, facilmente, ter sido piegas e parecer exagerado ao mostrar que investir num time de Rugby poderia mudar a auto-estima e segregação de um povo. Mas tá aí o crédito ao Eastwood ao conduzir o filme de forma que a gente se convença que Mandela não salvou a África do Sul ao voltar suas energias para o time de Rugby. Mas, pessoalmente, me levantei do sofá com o sentimento que é esse tipo de líder político que falta para governar o mundo. Um rebelde com toda paciência, humildade e tranquilidade. Que sabe para onde olhar, como olhar e como fazer.

sexta-feira, 9 de julho de 2010

Web 2.0 way of life

Seis e meia da manhã. Levantar da cama, pegar uma xícara de café e antes ainda de tirar o pijama, apertar a tecla power do computador que estava no modo stand by. Afinal, enquanto o usuário dorme, o computador baixa uns álbuns de músicas ou vídeos. Inclusive os que nem foram para as lojas ainda. Um bom dia aos amigos do twitter e antes mesmo de acessar o jornal digital, por ali mesmo já se informar das principais manchetes na cidade e no país. Claro, se você souber quem seguir. Dar uma olhada como será a temperatura do dia, se poderá ou não correr no parque no fim do dia.

Checar e-mails, dar o parabéns para amiga via Orkut (que, aliás, foi o que lembrou que hoje era aniversário dela), se informar pelo facebook que hoje tem aquele show tão esperado. Ouvir algumas músicas do novo álbum baixado durante a noite, uma rápida avaliação e em algum fórum fazer recomendações. Pronto, sete horas. Agora já pode tirar o pijama, tomar um banho e cuidar da vida. Essa rotina poderia parecer muito estranha para alguém em 2002. Hoje se torna cada vez mais comum. Trocar, escolher, compartilhar, opinar, participar. É essa a nova forma de se usar internet.

Há sete anos nascia o Itunes, uma loja de música digital fácil de usar, barata e rápida. Nos berços ao lado estavam o myspace e o skype. O objetivo do primeiro era reunir músicos. Bandinhas, bandas e bandonas podem ser ouvidas e descobertas através desse site. Um koreano pode ouvir hoje a demo de um grupinho de forró que foi mixada ontem, e quem sabe gostar muito e levar para um festival de bandas independentes em seu país. Já o skype veio aí para diminuir a saudade de quem mora longe ou aumentar namoros on-line. Vídeo e áudio de alta qualidade. E de graça, o que diminuiu as cifras das contas telefônicas de algumas casas.

2004 foi o ano dos blogs. Como toda nova invenção 2.0, ninguém sabia bem ao certo aonde isso ia dar ou o que fazer com aquilo. Alguns usaram como diário, outros para escreverem aquilo que não poderia ser publicado (seja pela linha editorial ou por falta de acesso aos veículos tradicionais). Alguns souberam fazer daquilo a fantástica possibilidade de jornalismo cidadão, que tem sido a grande esperança dos jornalistas que ainda sonham com um jornalismo melhor. Outros abusaram da criatividade e são pagos para fazer aquilo. Katylene e Hoje Vou Assim que o digam.

E daí os podcastings e youtube, que tiraram muita gente do sofá, que ficava ansiosa esperando chegar as nove horas da noite para ver aquele filme ou aquele programa. Um turbilhão de informações e descobertas. Foi o que o compartilhamento de vídeos e áudios proporcionou. Aqui, fica minha experiência pessoal. Hoje, uma das coisas que tenho mais dispensado meu tempo e mais vivido se chama Passarinhos do Cerrado. Um grupo de coco. Coco? Não sabe o que é isso? Eu também não sabia até 2008. Um ritmo nordestino que simplesmente enfeitiçou a mim e mais cinco goianos músicos.

A gente, por um ano, tocou esse ritmo, dançou, cantou, encantou um bando de goianos, viajamos e conseguimos nos tornar um grupo profissional sem nem conhecer Pernambuco (onde o ritmo é mais forte). Conhecemos e aprendemos tudo via youtube e rapidshare (como o próprio nome sugere, é para compartilhar). Depois de um ano pudemos pular carnaval por aquelas terras e re-conhecer todas as influências, que até então, eram virtuais para gente. Provavelmente se não existisse o youtube e o rapidshare no dia 20 de abril desse ano (nossa festa de aniversário), não reuniríamos 900 pessoas no Circo Laheto para dançar coco.

Esse exemplo, apesar de muito, mas muito singular mesmo entre as diversas experiências que a web 2.0 proporcionou para o universo musical expressa a potencialidade dessa nova forma de internet. Não há um ambiente hoje em que ela não tenha causado impacto. Universidade, escolas regulares, jornalismo, esporte, moda, publicidade, economia, política e por que não as religiões têm uma nova forma de atuarem. Aqueles que brigavam pela democracia e por poderem opinar se expressar nas décadas de 1960, 1970 e 1980, não poderia imaginar que a democracia, hoje conquistada, teria um aliado tão poderoso como web 2.0. Uma nova forma de se relacionar, de criar, de fazer política, cultura, economia e conhecimento.

Reencontro

Coisa comum é irmão mais velho ser a referência para os mais novos na infância. Bem, na verdade até hoje a Bruna, minha irmã, ainda é. Bruna era criança esperta, obediente, inteligente. Lembro de até me questionar porque ela era tão pretinha e eu não. Mas o que mais admirava era quando ela chegava da escola (eu ainda não estudava) cantando musiquinhas e meus pais adoravam. Afinadinha! E também quando Sandy e Junior tocava no disco e ela sempre ritmada, fazia passinhos bonitinhos. Já eu não nasci afinada. Nem tinha ritmo direito. Mas sempre gostava de ser aplaudida quando inventava minhas musiquinhas e cantava, mesmo desafinada. Minha mãe, de família musical (muito talentosa, por sinal) também insistia todo dia colocando alguma coisa pra me ensinar a dançar. De preferência "bada" ou lambada, meu ritmo favorito na infância. Na verdade eu não sei se gostava mais da lambada ou do vestidinho "de danxá bada".

Bem, a verdade é que a Bruna aos nove anos entrou no Coral Infantil da UCG, hoje PUC, onde meu pai é professor. Não preciso falar que eu não faltava uma apresentação e um ensaio. Minha mãe e meu pai foram se preocupando com meu envolvimento, afinal eu tinha certeza que assim que completasse sete anos, eu estaria ali dentro. Mas o obstáculo era um tal teste de aptidão. Meus pais acreditavam fielmente que dele minha desafinação não passava. Me enfiaram por um mês na casa da vizinha, que tem piano, e ensaiei repetidamente "parabéns pra você". Era a música que tinham pedido pra Bruna cantar no teste. Era março, como faço aniversário em maio, fui fazer o teste com seis anos mesmo. Sinceramente, não sentia a desconfiança dos meus pais. Talvez porque, abusada como sempre, eu tinha certeza que entraria ali no coral. Hãm, eu sabia todo o repertório! Já sabia até a postura de coral. Achei que isso era quase suficiente.

Se eu não estava tensa até então, não foi mesmo o teste que me deixou nervosa. Chegando na salinha do coral, na época bem pequena, me encontro com a tal Tia Elene, que já era minha tia também. Serena, com aquele jeito de lidar com gente que até hoje tento aprender. Sorridente me perguntou se poderia cantar "Atirei o Pau no Gato" batendo palma nos fins das frases. Tipo to-to, reu-reu, ca-ca. Não era parabéns que tanto tinha treinado. Mas deu tudo certo e ao fim, bem pedagogicamente, Tia Elene me pediu reservas e disse que estava impressionada com meu teste. Acreditei.

Foram onze anos no coral da Católica. Dos seis aos 17. "Carinhoso" foi a primeira música que aprendi. Cirandas também foi por aí que me ensinaram. Aos 10 fui desafiada a atuar, dançar e cantar com "A Magia de Monteiro Lobato". Dali, solo no Musical das Águas, quando comecei a viajar bastante sozinha. Depois entrei pro sexteto Musicanto. Foi quando cantar teve tom profissional. Por fim, até me rendeu viver experiência de atriz de cinema, no curta de Amarildo Pessoa "A Última Clareza".

Mas nada do que me aconteceu musicalmente e profissionalmente tem o mesmo impacto do que a formação humana que o coral, na pessoa da Tia Elene, me proporcionou. A verdade é que não dá pra pensar o que teria sido da minha vida, se não tivesse entrado no coral. E também não dá pra registrar tudo que vivi, aprendi, conheci nesse espaço. Encontrar a Tia Elene é uma sensação muito parecida com chegar em casa depois de uma longa viagem. Apesar do tia, ela teve papel de mãe, que cria, ensina e depois deixa o filho voar, ficando sempre de olho, mesmo que longe. Desde os meus 17 era sempre assim. Filho chegando em casa depois de viagem longa e falando como foi. Ou como está.

Quatro anos depois a moça que me ensinou a cantar lírico, mas também música popular brasileira, conhece o tal trabalho de coco que suas meninas estavam metidas. Ela gostou. Ufa. Assistiu, dançou, curtiu. Segunda passada, o reencontro. Sem timidez ou desconforto, eu e Bruna procuramos Tia Elene pra ajudar no vocal dos Passarinhos, que já não conseguimos mais avançar sem empurrão profissional. Sem pestanejar, com o mesmo sentimento de mãe, ela nos recebeu de volta na sala do Coral.

Acho que tá aí a graça da vida. Reencontrar. Que pessoas muito especiais passam por nossas vidas e que depois acabam indo, a gente aprende em cada página de frases de efeito na internet ou em livros auto-ajuda. Mas que vamos reencontrar e que elas serão especiais de novo não é certo. E quando acontece é talvez mais prazeroso do que se não tívéssemos nos afastado. Reencontrar uma música, um filme, uma cartinha, uma peça de roupa, um caderno. Não sou tão manteiga assim, nem tenho tendência a escrever coisas sentimentais e pensar sobre isso. Mas reencontrar a Tia Elene, o sentimento que vivi essa segunda, confesso, me fez refletir. Eu não só me reencontrei com ela, mas com minha infância, com minha formação, com meu aprendizado, minha história. Se não reencontramos, nossa história passa batido. Não paramos para lembrar como era. Mas, talvez, Walter Benjamin pode falar melhor sobre isso. Não me atrevo e já cansei as vistas do querido leitor.