quinta-feira, 20 de agosto de 2009

A NÃO LENDÁRIA GRIPE

Há poucos meses atrás eu encarava as matérias sobre Gripe Suína como mais um sensacionalismo da mídia. Mais uma boa pauta para gerar várias suítes, ganhar audiência (leitores ou ouvintes), provocar pânico e se mostrar como uma salvadora ao dar dicas como usar toalha de papel antes e depois de abrir uma torneira. Achava tudo um exagero, me lembro até de rir disso vendo jornal Hoje com meu pai. Me lembro de ler e-mails e acreditar que essa gripe veio à tona estrategicamente para abafar a crise financeira, a crise do sistema. Cheguei até a acreditar que pudesse ser mentira.
Reforçava o discurso que essa gripe era uma parcela muito mínima em relação a mortes causadas, por exemplo, por hepatite. Ao ler análises da gripe, relacionando OMS e OMC, o interesse da indústria farmacêutica, achei até mesmo que ela não fosse vingar, pois quem soltou o vírus, já teria a cura; cara, mas logo ia disponibilizar. Ri da secretária do meu trabalho que passava alcool em gel toda hora no telefone e não queria ficar perto de mim porque espirrava. Essa gripe não me amedrontava, achei que era distante de uma gripe espanhola, afinal, vivemos o século da biologia! Por várias vezes disse: "só acredito nessa gripe quando ver alguém do meu círculo de convivência afetado".
Hoje, com um telefone às 6:00 a.m tive vergonha de tudo que pensei. Essa gripe, hoje de manhã, me assustou, me deu medo, me deu raiva. Um amigo, relativamente próximo, estudante de Engenharia na UNICAMP, nos seus 20 e poucos anos, havia falecido por conta da maldita. Tive dor de pensar na mãe desse único filho recebendo a notícia do médico. Tive tristeza de pensar no futuro que ele foi cultivar em Campinas e que a partir de hoje, jamais aconteceria. Minha mente não se conforma que alguém tão bom, tão jovem, com tantos sonhos, tão saudável, tenha ido embora por conta dessa doença que todos os dias está no jornal, e eu subestimava. Eu simplesmente não consigo acreditar. Me dói... dói de lembrar a voz da minha irmã seguida do choro na manhã de hoje e que eu já sabia o que seria.
São nesses dias que paramos pra pensar em nossa insignificância. Em nossa impotência como simples seres habitantes desse mundo, parte de uma natureza que ora nos acolhe, ora nos encanta e ora nos fere brutalmente. Não há Darwin que me faça compreender, ou conformar. Pensei em cancelar a viagem à Curitiba, que farei em 15 dias. Mas não terei receio em parecer ridícula usando máscaras o tempo todo, carregando alcool em gel na bolsa e limpando a torneira com papel toalha antes e depois de lavar a mão. Hoje, pela primeira vez nos últimos meses, tremi ao ouvir na rádio que a gripe matou mais um.

sexta-feira, 10 de abril de 2009

LUTA PELO GRANDE HOTEL CONTINUA

LUTA PELO GRANDE HOTEL CONTINUA

Mais uma batalha começou na última quarta-feira dia 8, na guerra para conquista do Grande Hotel como Patrimônio da Cidade de Goiânia, espaço hoje pertencente ao INSS. O vereador Fábio Tokarski, vice-presidente da Comissão de Educação e Cultura, promoveu uma audiência pública na Câmara com o Secretário de Cultura Kléber Adorno, os Procuradores do INSS Claude Wagner e Francisco *, o vereador peemedebista, presidente da mesma comissão, Daniel Vilela, representantes e membros de entidades culturais e membros da Casa de Cultura Grande Hotel.
O Grande Hotel, (cedido pelo governo ao órgão na década de 1980 como contribuinte inadimplente) tem sido ocupado pela Secretaria de Cultura desde a gestão do Ex-Prefeito Pedro Wilson, há mais de 4 anos. Abrigando mais de 15 cursos e diversos projetos culturais, o espaço tornou-se democrático e uma Casa de Cultura, onde várias pessoas de diversas classes se beneficiam. Contudo, com uma ocupação desregularizada, o INSS quer o espaço de volta, estabelecendo uma briga entre a prefeitura e a sociedade goianiense contra o órgão responsável pela previdência social.
No primeiro capítulo, o Gerente Executivo do INSS, José Aparecido, enviou à Secretaria de Cultura um mandato de despejo. A ordem inquietou a sociedade e mobilizou membros da cultura a se manifestarem contra despejo. O vereador Fábio Tokarski logo tomou partido do problema e o levou à Câmara. Dali o problema chegou à secretaria de Cultura que encaminhou ao prefeito Íris Rezende. O prefeito propôs uma permuta de áreas, oferecendo um prédio em área privilegiada. Primeiramente o Gerente Executivo pareceu não se opor.
Segue o segundo capítulo. Como explicado na audiência pelo Procurador Claude Wagner, a aquisição de mais uma área não era interessante para o INSS. Segundo o Procurador, o órgão é dono de muitas áreas e no momento o que eles precisavam não era de mais áreas, mas de dinheiro para fazer uma caixa para construção de mais agências do INSS em Goiás. Sendo assim, o que o José Aparecido propôs então ao prefeito não foi mais uma permuta, mas a venda do prédio. Íris Rezende cedeu ao gerente e aceitou realizar a compra. Muitos comemoraram, os membros da Casa de Cultura se aliviaram, bem como os que lutavam pela sobrevivência de mais um espaço cultural em Goiânia. Mas a novela não acaba por aqui.
Na audiência do dia oito, o Procurador Claude Wagner surpreendeu a todos com um ofício proveniente da Delegacia da Receita Federal em que a mesma pedia a compra do Grande Hotel. Segundo o Procurador, como a Delegacia da Receita Federal pertence à União, assim como o INSS, ela tem prioridade na compra do prédio. Assim sendo, muda-se o foco da briga. Agora o próximo passo é o diálogo com a Delegacia da Receita Federal para que cedam a compra do prédio à prefeitura.
Todas as autoridades presentes na audiência reforçaram a necessidade de mobilização da sociedade para sensibilizar o órgão interessado na compra, bem como chamar a atenção da grande imprensa. “Imaginem a grande imprensa filmando um caminhão despejando cultura do Grande Hotel”, disse o secretário de Cultura, Kleber Adorno. Ele ainda chamou a atenção dos vereadores para somarem forças no cenário federal, com as autoridades que têm contato. Para Kleber, conquistar o Grande Hotel é uma questão que transcende a questão jurídica e de materialidade, mas uma questão de identidade cultural que está se criando ainda.
O Vereador Fábio Tokarski, em seu discurso de defesa ao espaço cultural, atentou para a carência de espaços culturais em Goiânia, e por isso não se pode perder mais esse. Além disso, o vereador ainda atentou para o fato do prédio se localizar no centro, ser de fácil acesso, o centro da polis e importante para que a ocupação dessa região não siga uma lógica mercadológica, mas democrática. Fábio Tokarski propôs uma conversa na Receita Federal no início da semana que se segue e que o assunto esteja na agenda política da cidade.



domingo, 5 de abril de 2009

A ANTIDEMOCRACIA DO SÉCULO XXI

A partir das 6 horas da tarde, no fim do expediente da maioria dos trabalhadores, é que a orelha do Lula começa a esquentar, ou do Íris, até mesmo a do Alcides. É a hora que os ônibus se enchem, o trânsito pára e os brasileiros se dão conta dos problemas sociais. É a hora que juntam na mesa do bar para reclamar que a crise está demais ou na frente da tevê para se horrorizarem com notícias de violência. E a culpa é sempre dos grandes, dos que não fazem nada. Quem tem poder que resolva. Não é isso? Talvez não sozinhos.
Há um mecanismo presente diariamente em vários ofícios correndo nas câmaras e assembléias chamado audiência pública. Talvez não tão eficientes por malas diretas não tão atualizadas ou por comunicação ineficácia. Mas, existem e são meios democráticos onde quem sofre fala, é ouvido e deve ser respeitado. Nem sempre trabalhadores podem ir em plena terça-feira às 15 horas na Câmara, mas provavelmente na escola do seu setor num sábado às 9 horas, há disponibilidade. Diferente de disposição. Foi o que ocorreu no Goiânia 2 há 15 dias atrás, que apesar de bem divulgada (com flyers nas caixas de correio, no comércio e carros de som) a audiência contou com menos de cinquenta moradores.
A audiência objetivava ouvir os problemas, apenas ouvir. Depois, com a união de civis, entidades e legislativo, começarem a trabalhar para saná-los. E aí está o vilão da cidadania brasileira: o povo não está acostumado a se envolver, mas a ser assistido. É o que chama Pedro Demo de pobreza política, aquela em que o indivíduo é marginalizado das esferas políticas (ou aqui, ele se marginaliza), em que ele é assistido, acostumado a se contentar com bolsas e cestas, em que espera alguém fazer por ele: Deus ou um político, ambos podem ser divinos.
Nesse sentido que a cidadania brasileira é às avessas da Inglesa (que, querendo ou não, é uma cidadania bem estruturada). Foi a partir de lutas sociais que os direitos foram conquistados e tornados leis: primeiro os civis e políticos (como o direito ao voto e à educação) e depois os sociais (como os trabalhistas). No Brasil foram os sociais, e depois os civis e políticos (basta pensar quem podia votar na década de 1930). Aqui, o direito tem sexo, cor, religião e orientação sexual, como apresenta José Murilo de Carvalho. Isso porque, segundo o pesquisador, os direitos não surgiram de lutas sociais. Que lei adveio de Canudos? E da Praieira? Mesmo os grandes movimentos massivos, são barrados pela força parlamentar, como foi o caso do movimento em prol da reforma agrária barrado pelo coronel Ronaldo Caiado e sua UDR.
E para os que acham que democracia se limita ao voto, em um contexto de ditadura (e aqui não preciso descrever a antidemocracia), na década de 1960, 18% votaram, enquanto na de 1980, eram 47% os que iam às urnas. Ser cidadão é mais que votar de 4 em 4 anos, é mais que reclamar em filas de terminais e botecos. Para Hannah Arendt, ser cidadão é condição humana, mas levantar em um sábado, falar dos problemas do bairro e lutar pela solução também o é.
*Inspirada por um palestra do mestrando na FACOMB, Valderes.

O AVANÇO

O dia tinha sido quente. Por todas as vezes que saí de minha mesa fui respirar um pouco pela janela, vi o termômetro da rua marcar 34 graus. São nesses dias de trabalho intenso e monótono, em pleno agosto que nunca tem fim, que tudo parece conspirar para o erro. Meu relógio parecia estar estragado. Por umas duas vezes dei uma batidinha nele achando que estava estragado. Seis horas demorou a chegar.
Fui para o ponto esperar o ônibus que ia para universidade. Ele sempre passava às seis e dez. Uma mulher de cabelos vermelhos com seu filho de uns quatro sempre pegava o mesmo ônibus. O senhor da boina sempre estava ao lado esquerdo do ponto lendo seu jornal. O cara do terno sempre reclamava da crise. E eu estava cansada da mesmice. Apesar de naquele dia concordar com o cara do terno. A passagem subiu o preço por causa da tal crise. Foi quando me lembrei que não tinha comprado o passe. Nem a mulher dos cabelos de fogo, nem o senhor da boina, nem o cara do terno tinham um passe pra me vender. Na banca de jornal, atrás do ponto, que sempre vendia passe, hoje tinha acabado.
Seis e dez, subi no ônibus menos preocupada com o passe e mais com a prova de história de arte que começaria em 30 minutos. Ainda teria que ler os resumos da Ana, são sempre ótimos. Sempre tinha alguém dentro do ônibus com um passe pra me vender. Mas, naquele dia não tinha. Insisti para o motorista aceitar meu dinheiro trocado e me passar, mas foi em vão. Meus olhos fixaram naquela maquininha que só sabia aceitar e recusar bilhetes e fiquei nervosa. Ah, como desejei que fosse aquele cobrador, em sua limitada atividade de receber dinheiro e dar troco, mas que sabia conversar e entender que eu tinha prova.
O motorista não tirou os olhos de sua rota, e não hesitou em me levar ao terminal final para eu comprar meu passe, oito kilômetros para frente de minha faculdade. Toda minha raiva e transtorno me fizeram lembrar do dia em que passou no noticiário que minha cidade agora era moderna. Os ônibus não teriam mais cobradores e uma máquina bem os substituiria. Eu, em meu sofá, me alegrei julguei aquilo um avanço. Não imaginava que um mero cobrador poderia me ajudar a não reprovar em história da arte.