domingo, 5 de abril de 2009

O AVANÇO

O dia tinha sido quente. Por todas as vezes que saí de minha mesa fui respirar um pouco pela janela, vi o termômetro da rua marcar 34 graus. São nesses dias de trabalho intenso e monótono, em pleno agosto que nunca tem fim, que tudo parece conspirar para o erro. Meu relógio parecia estar estragado. Por umas duas vezes dei uma batidinha nele achando que estava estragado. Seis horas demorou a chegar.
Fui para o ponto esperar o ônibus que ia para universidade. Ele sempre passava às seis e dez. Uma mulher de cabelos vermelhos com seu filho de uns quatro sempre pegava o mesmo ônibus. O senhor da boina sempre estava ao lado esquerdo do ponto lendo seu jornal. O cara do terno sempre reclamava da crise. E eu estava cansada da mesmice. Apesar de naquele dia concordar com o cara do terno. A passagem subiu o preço por causa da tal crise. Foi quando me lembrei que não tinha comprado o passe. Nem a mulher dos cabelos de fogo, nem o senhor da boina, nem o cara do terno tinham um passe pra me vender. Na banca de jornal, atrás do ponto, que sempre vendia passe, hoje tinha acabado.
Seis e dez, subi no ônibus menos preocupada com o passe e mais com a prova de história de arte que começaria em 30 minutos. Ainda teria que ler os resumos da Ana, são sempre ótimos. Sempre tinha alguém dentro do ônibus com um passe pra me vender. Mas, naquele dia não tinha. Insisti para o motorista aceitar meu dinheiro trocado e me passar, mas foi em vão. Meus olhos fixaram naquela maquininha que só sabia aceitar e recusar bilhetes e fiquei nervosa. Ah, como desejei que fosse aquele cobrador, em sua limitada atividade de receber dinheiro e dar troco, mas que sabia conversar e entender que eu tinha prova.
O motorista não tirou os olhos de sua rota, e não hesitou em me levar ao terminal final para eu comprar meu passe, oito kilômetros para frente de minha faculdade. Toda minha raiva e transtorno me fizeram lembrar do dia em que passou no noticiário que minha cidade agora era moderna. Os ônibus não teriam mais cobradores e uma máquina bem os substituiria. Eu, em meu sofá, me alegrei julguei aquilo um avanço. Não imaginava que um mero cobrador poderia me ajudar a não reprovar em história da arte.

Um comentário:

  1. Nossa, Nádia...muito bom esse!
    Bem escrito, reflexivo, crítico... aliás, nem sei, mas podemos
    tecer comentários aqui?

    Continue praticando o talento.

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